27.5 C
Brasília
quinta-feira, 21/11/2024
--Publicidade--

Em que momento a estratégia dos EUA para a África falhou?

Brasília
nuvens dispersas
27.5 ° C
27.5 °
26.5 °
61 %
3.1kmh
40 %
qui
28 °
sex
27 °
sáb
25 °
dom
23 °
seg
22 °

Em Brasília

Em conversa com a Sputnik Brasil, analistas internacionais explicaram as razões do insucesso das estratégias dos EUA para o continente africano, cujos países, nas últimas décadas, estreitaram relações com China e Rússia.

© AP Photo / Alex Brandon
Existe um problema envolvendo as relações entre EUA e África: a Lei de Crescimento e Oportunidades para a África (AGOA, na sigla em inglês). A necessidade de uma revisão no documento é uma questão que foi identificada tanto pelos líderes do continente quanto por Washington. Entretanto a falta de consenso paralisou as negociações.
Em entrevista às repórteres Melina Saad e Thaiana de Oliveira, do podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, os analistas internacionais Tahirá Endo, professor da Universidade Jean Piaget de Angola, e Wanilton Dudek, professor da Universidade Estadual do Paraná (Unespar), falaram sobre a distância que separa os distintos interesses africanos das pretensões globais dos EUA.
Para compreender o que está ocorrendo, conforme explicou Tahirá Endo, é preciso analisar a conjuntura da AGOA, que está ruindo: em 31 de dezembro de 2022, apenas 36 países da África subsaariana (são 47 no total) estavam elegíveis para fazer parte do tratado; no início deste ano, o governo norte-americano retirou Burkina Faso do acordo.
Ambos os analistas apontaram que a AGOA, uma espécie de Plano Marshall para o continente africano, ao determinar uma série de gatilhos econômicos e sociais ligados às práticas do neoliberalismo ocidental, afasta os países da África do seu objetivo principal: fomentar o comércio com os EUA.

A crise da AGOA

A Lei de Crescimento e Oportunidades para a África é a política dos EUA para o continente africano. Ela oferece, aos países do continente que estão qualificados para ingressar no tratado, acesso isento de impostos ao mercado dos EUA para quase 7 mil produtos.
O problema do tratado, conforme explicou Tahirá Endo, é que Washington, ao contrário da China, não busca apenas o desenvolvimento das relações bilaterais com países africanos. O governo dos EUA “condiciona as questões de comércio às práticas determinadas por organizações como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional [FMI]”.
“Com a exigência de reformas estruturais, políticas e econômicas pautadas pelas agências do neoliberalismo, as relações se tornaram pouco expressivas”, diz ele, observando que o “pacote de imposições subjetivas” de Washington, como uma “economia baseada no mercado”, o respeito aos direitos humanos e o “combate à corrupção”, são práticas para as quais não há uma régua de aferição.
Wanilton Dudek classificou a AGOA de “uma política para colocar os africanos sob a tutela dos EUA”. Para ele, “ainda que o tratado tenha impulsionado a economia de alguns países da região, principalmente quando o ciclo de commodities está alto”, isso não significou exportação de produtos com alto valor agregado, pois, “a longo prazo, não há desenvolvimento da estrutura econômica e tampouco geração de emprego”.
Ainda assim, conforme destacou o analista, o Congresso dos EUA aprovou uma legislação estendendo o programa até 2025, em um momento em que Rússia e China expandem seus negócios no continente africano e na esteira das recentes crises políticas em Guiné-Bissau, Mali e Burkina Faso.

África: mais distante dos EUA, mais próxima da China

Desde 2000, quando a AGOA foi assinada, as autoridades norte-americanas expandiram algumas vezes a lista de produtos beneficiados pelo tratado, uma tentativa de aprofundar a cooperação com a África. No entanto, segundo Wanilton Dudek, as “ferramentas de pressão” seguem intactas.
Quem ganha com isso, sustentam os analistas, é a China, que, ao financiar obras no continente, não faz exigências políticas ou sociais aos países. A “globalização alternativa” de Pequim, centrada na exportação de bens públicos, como estradas e ferrovias, e na Nova Rota da Seda, revela que os países não querem lição de democracia, mas indústrias e desenvolvimento.
Tahirá Endo inclusive entende que o projeto de hegemonia dos EUA, ao fazer imposições consideradas fundamentais para as democracias ocidentais, mostra desconhecimento sobre os problemas dos países da África, ainda muito afetados pelo recente processo de independência após anos de neocolonialismo europeu.
Durante a Cúpula de Líderes EUA–África, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden (ao centro), fala sobre parceria na Agenda 2063, da União Africana. Washington, EUA, 15 de dezembro de 2022 - Sputnik Brasil, 1920, 27.01.2023
Durante a Cúpula de Líderes EUA–África, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden (ao centro), fala sobre parceria na Agenda 2063, da União Africana. Washington, EUA, 15 de dezembro de 2022
Essa falta de sensibilidade é muitas vezes a razão pela qual diversos países se retiram (ou são retirados) do tratado com os EUA. Ao expulsar Burkina Faso, por exemplo, os EUA alegaram que a junta militar que assumiu o poder em setembro de 2022, após um golpe de Estado, “cometeu abusos de direitos humanos”. Já com o Zimbábue, expulso em outro momento, o argumento foi “a aprovação de reforma agrária que feria os princípios do neoliberalismo”, segundo Tahirá Endo.
Esses argumentos, entretanto, como apontou o especialista, ignoram as dificuldades e particularidades de cada país do continente africano, afinal não é possível, como os EUA gostariam, “que os fundamentos da democracia ocidental sejam transportados para os países da África”.

Wanilton Dudek, ao concluir seu argumento, afirmou que os EUA “entendem a região africana como um lugar para extrair riquezas, além de fortalecer os EUA globalmente, sob o aspecto militar, cultural e econômico, pela exportação de valores ocidentais norte-americanos”.

 

--Publicidade--

Veja Também

- Publicidade -