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domingo, 24/11/2024
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Em dois anos, Lira troca discurso contido por defesa da democracia e da independência entre Poderes

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Em Brasília

Na primeira vitória, as palavras mais usadas pelo presidente da Câmara foram termos como ‘Casa’, ‘plenário’ e ‘deputado’; desta vez, ele preferiu ‘Brasil’ e ‘política’

(Pablo Valadares/Agência Câmara)

Em 2021, Arthur Lira (PP-AL) foi eleito presidente da Câmara dos Deputados no esteio do tensionamento da relação entre a Casa, antes comandada por Rodrigo Maia (ex-DEM-RJ, hoje PSDB-RJ), e o então presidente Jair Bolsonaro. Aposta do ex-chefe do Executivo para evitar novas derrotas e fazer avançar pautas conservadoras, o expoente do chamado Centrão superou Baleia Rossi (MDB-SP) com uma margem confortável — 302 a 145 votos —, mas apostou em um discurso da vitória em tom contido, voltado para o apaziguamento interno e medidas de combate à pandemia da Covid-19. Reeleito nesta quarta-feira, Lira, se não abandonou a postura conciliadora, também optou por encampar uma mensagem mais enfática com foco na defesa da democracia e na independência entre os Poderes, além de recados direcionados ao Judiciário.

“Há duas tribunas, uma à esquerda e outra à direita. Ambas as tribunas estão à mesma altura e devem ser vistas com o mesmo distanciamento e ouvidas com a mesma proximidade”, disse o presidente recém-vitorioso em 2021, pouco depois de pedir um minuto de silêncio para as vítimas do coronavírus, em um aceno para todo o espectro ideológico da Casa. Apesar de críticas sutis a Rodrigo Maia, tratado por ele como autoritário — “temos de deixar de ser a câmara do EU e sermos a câmara do NÓS”, afirmou —, Lira elogiou Baleia Rossi e até o antecessor: “Nenhuma diferença ou discordância de nossa parte nunca será maior do que os pontos que nos unem e nossas convergências em torno daquilo que todos desejamos para um Brasil mais justo e melhor para a nossa gente”.

O discurso voltado para o público interno naquela ocasião é reforçado por uma análise dos termos mais usados no pronunciamento. As palavras mais frequentes foram “presidente” (15 vezes), sempre se referindo ao próprio posto, “Câmara” (13), “Casa” (12), “plenário” (nove) e “deputado” (oito). A mudança de tom na comparação com o momento pós-reeleição é nítida: desta vez, ele preferiu usar os termos “Brasil” (15 vezes), “democracia” (dez), “política” (oito), “Casa” (sete) e “brasileiro” (seis).

Cacifado pela votação recorde (464 votos de 513 possíveis) e mais de 50% maior do que na disputa anterior, Lira optou, agora, por tratar com mais ênfase da situação geral do país. Apoiado tanto pelo PL de Jair Bolsonaro quanto pelo governo Lula, ele recriminou veementemente os atos golpistas ocorridos em Brasília no dia 8 de janeiro, protagonizados justamente por apoiadores do ex-presidente e aliado:

“Esta Casa não acolherá, defenderá ou referendará nenhum ato, discurso ou manifestação que atente contra a democracia. Quem assim atuar, terá a repulsa deste Parlamento, a rejeição do povo brasileiro e os rigores da lei. Para aqueles que depredaram, vandalizaram e envergonharam o povo brasileiro haverá o rigor da lei”, assegurou Lira, que prometeu medidas para que “o fatídico 8 de janeiro não venha a acontecer nunca mais”.

Em 2021, a única referência mais direta às relações entre Poderes veio no contexto da Covid-19. “O país atravessa a mais cruel, devastadora e feroz pandemia do último século, o povo sofre com seus efeitos e mais do que nunca precisa que os poderes da República atuem com harmonia e responsabilidade, sem abrir mão de sua independência”, discursou. Na reeleição, a mensagem relativa ao tema foi mais objetiva, com direito a um pedido por “cada um no seu quadrado”:

“É hora de desinflamar o Brasil. Distensionar as relações. E os Poderes da República, pilares da nossa democracia, devem dar exemplo. É hora de ver cada um no seu quadrado constitucional, para voltarmos a ver os Poderes articulando, interagindo com a clareza exata de onde termina o espaço de um e começa o do outro”, cobrou o presidente da Câmara, que pregou contra a “judicialização” excessiva da política. “Não dá mais para usurpar prerrogativas, interferir em decisões amplamente debatidas, votadas e aprovadas. O Legislativo é o poder moderador da República e assim continuará sendo. Não dá mais para que as decisões tomadas nesta Casa sejam constantemente judicializadas e aceitas sem sustentação legal.”

Em outra referência clara ao Judiciário, tema quase inexistente na vitória anterior, Lira também fez críticas duras à Lava-Jato, ainda que não tenha citado nominalmente a operação.

“O processo de criminalização da política, iniciado há quase uma década, abalou a representatividade de diversas instituições e seus representantes. Transformaram denúncias, que deveriam ser apuradas sob o manto da lei, em verdadeiras execuções públicas. Empresas foram destruídas, empregos foram ceifados, reputações jogadas na lata do lixo. Esses atos, muitas vezes, burlaram as leis, o direito à defesa, e foram o estopim para um clima hostil em relação à política. E aqui não faço a defesa do mal feito. Quem faz algo errado deve pagar, responder por seus delitos, ou provar inocência e ter o direito de seguir em frente, de cabeça erguida.”

Por fim, Lira deu recados, mesmo que sutis, sobre a atuação recente do Supremo Tribunal Federal (STF) — embora não tenha, novamente, mencionado diretamente a Corte ou tratado de decisões específicas. Ao abordar a “liberdade de expressão de cada parlamentar”, o presidente da Câmara sinalizou a uma pauta cara ao bolsonarismo, cujos expoentes vêm sendo alvo de medidas frequentes de bloqueio de redes sociais e exclusão de conteúdos considerados falsos ou de teor golpista.

“Seguiremos devotos da democracia e, para tanto, serei uma voz firme a favor das prerrogativas e liberdade de expressão de cada parlamentar, porque precisamos exercer nosso mandato de maneira plena”, disse Lira.

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