Parte dos estrategistas de mercado avalia o patamar atual de R$ 4,70 como insustentável, mas há tantos outros que preveem queda adicional da moeda
A intensa desvalorização do dólar em relação ao real, na casa de 15% no acumulado deste ano, tem desafiado as projeções de economistas. Enquanto parte do mercado vê como improvável a manutenção da moeda nos níveis atuais, perto das cotações do começo de 2020, outra parcela acredita que ainda há espaço para o dólar cair mais.
A disparidade das projeções é reflexo tanto da diferença dos modelos utilizados quanto das avaliações sobre os principais fatores que exercem influência na direção da moeda. Conheça a seguir 3 principais:
1. Juros no Brasil e nos EUA
O aumento da taxa de juros pelo Banco Central do Brasil tende a valorizar a moeda local, o real, tornando mais atrativos os investimentos em títulos de um determinado país. O ciclo de alta da Selic, que saiu de 2% ao ano em março de 2021 para 11,75% (com projeção para ir a pelo menos 12,75%), tem sido um dos propulsores da apreciação do real.
Agora, investidores e estrategistas tentam decifrar o ritmo do aperto monetário dos Estados Unidos, cuja taxa de juros está no intervalo entre 0,25% e 0,50%, e avaliar como isso pode impactar o câmbio no Brasil.
A expectativa consensual é que o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, intensifique a elevação de juros de 25 para 50 pontos base na reunião de 3 e 4 de maio – e repita a dose por mais duas ou três reuniões. O aperto monetário deve vir também pela redução do balanço patrimonial do Fed, processo que deve ter início em maio.
Parte do cenário esperado já está nos preços, mas surpresas do lado da inflação podem fazer o mercado e o próprio Fed revisarem para cima a intensidade das políticas contracionistas nos Estados Unidos.
“O ciclo de aperto monetário em países desenvolvidos tende a ser negativo para a nossa moeda. É natural que parte dos ativos vá para os Estados Unidos. Mas o tamanho do impacto vai depender muito da velocidade e da magnitude do aperto, que ainda não estão totalmente definidos. Há um debate acontecendo no Fed”, disse Luca Mercadante, economista da Rio Bravo Investimentos.
Economistas do BTG Pactual projetam mais quatro altas de 50 pontos base na taxa de juros nos Estados Unidos e outra de 25 pontos base ainda neste ano, levando a taxa de juro a 2,75%. Para 2023, o banco espera mais quatro altas de 25 pontos base, com o juro encerrando o ano a 3,75% — nível considerado “desfavorável para o real”.
2. Preços de commodities
A guerra na Ucrânia e as sanções econômicas à Rússia pelo ataque unilateral causaram um choque de oferta de commodities, contribuindo para a alta de preços. O Brasil, distante do conflito e com muitas empresas que produzem e exportam matérias-primas, tornou-se uma das principais apostas para investidores globais.
“O arrefecimento das tensões entre Rússia e Ucrânia acomodou os movimentos altistas das commodities mais afetadas pelo conflito, mas não mudou o quadro favorável para exportadores desses bens, que negociam em patamares de preços favoráveis. Esse quadro deve seguir fortalecendo o real”, disseram economistas do BTG Pactual em relatório.
A entrada de capital externo na bolsa está em R$ 67 bilhões neste ano, com o estrangeiro sendo responsável por mais de 50% das movimentações da B3, embora nos últimos dias tenha havido mais saída do que ingresso de capital.
Além da entrada de recursos de estrangeiros, a balança comercial (saldo entre exportações e importações) do Brasil acaba sendo beneficiada pelos preços mais altos de commodities.
“O superávit comercial brasileiro segue em patamar historicamente elevado, impulsionado pela alta de preços de commodities. A média móvel trimestral dessazonalizada e anualizada avançou para US$ 79 bilhões”, disse o Itaú BBA em relatório. A projeção do banco de investimento, porém, é que esse volume caia para US$ 74 bilhões, com o dólar encerrando o ano a R$ 5,25.
3. Eleições presidenciais
As incertezas que acompanham as eleições presidenciais costumam adicionar volatilidade aos mercados. Neste ano, movimentos dos candidatos favoritos à Presidência para o centro tem provocado certo otimismo entre investidores.
A aliança do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o ex-governador Geraldo Alckmin e a “calmaria” recente do presidente Jair Bolsonaro — apesar da demissão novamente intempestiva do CEO da Petrobras, Joaquim Silva e Luna — são vistas como sinais positivos pelo mercado. Mas as preocupações com eventuais políticas populistas seguem vivas, ainda mais que os discursos podem mudar na caça por eleitores com a aproximação do pleito em outubro.
“O ambiente eleitoral pode mitigar o apetite por risco e fazer com que a queda do dólar tenha efeito limitado”, disse Bernardo Assumpção, CEO da Arton Advisors.
Sinalizações de abandono da âncora fiscal de qualquer um dos lados estarão no centro das atenções durante os discursos dos presidenciáveis.
“Ainda existem dúvidas relacionadas à evolução das contas públicas e à sustentabilidade fiscal nos próximos anos”, afirmou o Itaú BBA.