O artigo foi redigido pelo professor Dan Baumgardt, da Escola de Fisiologia, Farmacologia e Neurociência da Universidade de Bristol, no Reino Unido, sendo publicado na plataforma The Conversation Brasil.
Quando a pandemia da Covid-19 começou, muitas pessoas buscaram o filme Contágio (2011), assustadoramente previsível, atrás de respostas ou de alguma forma de alívio. De repente, a trama ficcional parecia muito próxima da realidade. Elogiado por sua exatidão científica, o filme ofereceu além do suspense, ensinamentos importantes.
Uma cena destaca-se especialmente. A personagem interpretada por Kate Winslet explica de forma clara o poder infeccioso de vários patógenos – detalhando como eles podem ser transmitidos através das mãos para diversos objetos usados no dia a dia, como maçanetas, copos para beber, botões de elevador e de pessoa para pessoa. Esses objetos, conhecidos como fômites, atuam como portas silenciosas para a infecção.
Além disso, a personagem esclarece o conceito do valor R0 (ou R-naught), que indica o número médio de pessoas que uma pessoa infectada poderá contagiar. Por exemplo, um R0 igual a dois significa que um paciente infectado poderá transmitir a doença a duas pessoas, que por sua vez infectarão outras quatro, e assim a epidemia pode crescer rapidamente.
O valor R0 é usado para prever a propagação da infecção em uma população: valores maiores que um indicam que a doença vai crescer; igual a um indica estabilidade; e inferior a um, a tendência da doença é desaparecer com o tempo.
Existem diversas formas de transmissão das doenças infecciosas, variando de gotículas expelidas ao tossir ou espirrar, contato com sangue, vetores como carrapatos e mosquitos, ou pela ingestão de alimentos e água contaminados.
Compreender como as infecções se propagam é fundamental para nossa defesa, ajudando também a proteger as outras pessoas ao nosso redor. A seguir, apresentamos um resumo de algumas das doenças mais e menos contagiosas do mundo.
Doenças altamente contagiosas
Dentre as doenças com maior facilidade de espalhar-se está o sarampo.
O sarampo tem retornado globalmente, mesmo em países desenvolvidos como Reino Unido e Estados Unidos. Entre as causas estão a queda nas taxas de vacinação infantil, prejudicada por eventos como a pandemia da Covid-19, conflitos mundiais e a disseminação de informações falsas sobre vacinas.
O valor R0 do sarampo fica entre 12 e 18. Isso significa que, em poucos ciclos de transmissão, centenas de pessoas podem contrair a doença a partir de um único infectado. Contudo, a vacinação age como um escudo eficaz, reduzindo o número de pessoas vulneráveis na população.
O sarampo é extremamente contagioso, transmitido por minúsculas partículas no ar liberadas por tosse ou espirros, e não necessita de contato direto para infectar outra pessoa. Uma pessoa não vacinada pode contrair o vírus simplesmente ao entrar em um ambiente onde uma pessoa contaminada esteve presente até duas horas antes.
O que é o sarampo?
Após sua eliminação no Brasil em 2016, o sarampo voltou a circular no país devido à queda na vacinação. Em 2025, o Brasil foi novamente declarado livre da doença.
Essa doença altamente contagiosa pode permanecer no ar por até 24 horas, e seu risco é maior que vírus como o da gripe e da Covid-19.
O sarampo pode desencadear complicações sérias, como pneumonia e encefalite, especialmente em crianças menores de cinco anos, podendo ser fatal.
A principal proteção contra o sarampo é a vacina tríplice viral, aplicada em duas doses na infância, aos 12 e 15 meses. Em surtos, o Ministério da Saúde recomenda a vacinação a partir dos seis meses e reforço para adultos.
Pessoas infectadas podem transmitir o vírus antes mesmo de apresentarem sintomas, aumentando a dificuldade no controle da propagação.
Outras infecções com alto R0 incluem coqueluche (ou tosse convulsa), com valores entre 12 e 17, varicela (10 a 12) e a Covid-19, com variações conforme o subtipo, mas geralmente entre oito e 12. Embora muitos infectados se recuperem, essas doenças ainda podem causar complicações graves e até mortes.
Baixa propagação, alto risco
No espectro oposto, infecções com valores mais baixos de R0 não são necessariamente menos graves.
Um exemplo é a tuberculose (TB), com um R0 entre menos de um e quatro, dependendo das condições locais como habitação e acesso à saúde.
Causada pela bactéria Mycobacterium tuberculosis, a tuberculose se transmite pelo ar, mas exige contato próximo e prolongado com uma pessoa doente. As contaminações geralmente ocorrem em ambientes compartilhados, como lares, abrigos ou prisões.
O real desafio da tuberculose é o tratamento, que exige combinação de múltiplos antibióticos por pelo menos seis meses. Antibióticos comuns como penicilina não funcionam, e a infecção pode se espalhar para outros órgãos além dos pulmões.
Além disso, crescem os casos de tuberculose resistente, que não respondem a tratamentos comuns.
Outras infecções com R0 baixo incluem o vírus Ebola, que apesar de muito letal, necessita de contato direto com fluidos corporais para se propagar. Seu R0 varia entre 1,5 e 2,5.
Doenças com R0 menor que um, como a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (Mers), gripe aviária e hanseníase, são menos contagiosas, mas seu potencial de gravidade deve ser levado a sério.
A ameaça das doenças infecciosas está relacionada não só a seus efeitos no organismo, mas também à facilidade de transmissão. Medidas preventivas, especialmente a vacinação, são cruciais para proteger indivíduos e conter a disseminação para pessoas vulneráveis que não podem ser vacinadas, como lactentes, gestantes e indivíduos com alergias severas ou imunidade comprometida.
Nesse contexto, a imunidade coletiva é fundamental para proteger a população mais suscetível.
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