ANA POMPEU
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), aproveitou seu voto sobre as medidas adotadas contra o ex-presidente Jair Bolsonaro para criticar as ações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o Brasil. Segundo Dino, as atitudes de Trump configuram uma “estratégia inaceitável de retaliação política”.
Flávio Dino concordou com o ministro Alexandre de Moraes, apoiando a decisão que autorizou a Polícia Federal a agir contra Bolsonaro e que aplicou medidas como o uso de tornozeleira eletrônica e a proibição de comunicação com seu filho, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (que está nos EUA).
Em seu voto, com 10 das 13 páginas, Dino citou declarações de Trump, menções de outros ministros como Gilmar Mendes em redes sociais, uma carta do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, e notas de entidades diversas. Ele apresentou ainda dados do governo brasileiro para contestar os argumentos dos EUA.
Para o ministro, o governo americano está fazendo um “sequestro econômico” com o objetivo de ajudar Bolsonaro.
“Essa pressão assume uma forma inédita, sequestrando a economia de uma nação, ameaçando empregos e empresas, para forçar o STF a interromper um processo judicial conduzido de acordo com as leis brasileiras”, afirmou.
O processo sigiloso que resultou nas medidas contra Bolsonaro foi registrado no STF e assinado por Alexandre de Moraes em 11 de julho, dois dias após Trump anunciar uma sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros, mencionando o processo no STF.
A Primeira Turma do STF começou a analisar essas medidas ao meio-dia, e a votação continuará até às 23h59 da segunda-feira (21), com maioria já favorável à manutenção da decisão de Moraes.
Além de Alexandre de Moraes, a Turma conta com os ministros Cristiano Zanin (presidente), Cármen Lúcia, Luiz Fux e Flávio Dino.
Para Dino, é claro que a retaliação política é inaceitável e desrespeita a soberania do Brasil, pressionando instituições públicas, incluindo o STF, para que acatem os interesses pessoais de um líder estrangeiro.
Bolsonaro foi alvo de buscas feitas pela Polícia Federal na manhã de sexta-feira, e Alexandre de Moraes pediu urgência na tramitação do caso.
Dino também fez uma reflexão sobre a relação atual entre Brasil e EUA.
“Os eventos que motivaram essa decisão estão ligados diretamente a ações de um governo estrangeiro que tentam interferir em competências exclusivas do STF. É importante lembrar que a Constituição reconhece a soberania nacional como base da República”, explicou.
Segundo ele, na política internacional, um país não pode exigir que outro mude suas instituições para atingir objetivos políticos.
“Portanto, devem ser combatidos atos que tentam controlar como o Brasil organiza suas instituições”, completou Dino.
O ministro também retomou os fatos desde 9 de julho, quando Trump enviou uma carta ao presidente Lula e anunciou as sanções econômicas. Segundo Dino, as medidas são motivadas por interesses políticos e não há justificativa técnica para aumentar tarifas. Dados oficiais mostram que o Brasil tem déficit comercial com os EUA desde 2009.
Dino alertou que cidadãos brasileiros que apoiam interferência estrangeira contra o Poder Judiciário para benefício próprio devem ser avaliados juridicamente. Ignorar essa situação seria uma traição ao país, algo incompatível com os deveres do STF.