No Dia Internacional da Mulher, é possível ver que houve avanços no país, apesar de a situação ainda estar longe do ideal
‘Era um jogo combinado, fulano vai te cortar, você não vai conseguir terminar a frase. Eu entro e falo: ‘Espera, deixa a Claudia falar’. Era esse o nível de planejamento para conseguir ocupar o espaço que merecia’. Foi assim que Claudia Woods, atualmente CEO da WeWork no Brasil, conseguia ter voz em reuniões quando começou sua carreira de gestão em grandes empresas, apoiando-se nesse diálogo ensaiado entre ela e um homem. Acostumada à informalidade das startups, viu-se em um ambiente em que era a única mulher na mesa da diretoria.
Claudia integra a pequena fatia de mulheres sentadas na cadeira de CEO no país: elas somam apenas 17% do total. Ainda assim, hoje, quando se comemora o Dia Internacional da Mulher, é possível ver que o avanço foi inegável no Brasil. No ano passado, o país passou da 94ª posição no ranking de igualdade de gênero do Fórum Econômico Mundial para a 57ª colocação — subida puxada principalmente por uma maior presença feminina em órgãos do governo e no Legislativo.
Híbrido ajuda
Na empresa comandada por Claudia, 56% da liderança estão em mãos femininas. Não é mais um exercício solitário como era no início de carreira de gestão de várias mulheres que já têm o nome consolidado no mercado, diz. E o trabalho híbrido pode contribuir para acelerar essa mudança:
— Daqui a dez anos, vai ter um equilíbrio maior entre homens e mulheres. Esse modelo chegou para ficar e deve causar um impacto muito grande na quantidade de mulheres dentro do ambiente de trabalho e da alta liderança, com mais autonomia para ditar sua agenda.
No mercado de trabalho como um todo, o salto foi significativo nas últimas décadas. Nos anos 1980, as mulheres representavam apenas 33,5% da população ocupada. Em 2023, essa fatia sobe para 43%. O salário cresceu e se aproximou do ganho dos homens. Nos anos 1970, representava 56% do rendimento masculino subindo em 2023 a 79,2%. A velocidade e a qualidade dessa entrada da mulher no mercado de trabalho dependem para onde se olha, diz Ana Diniz, pesquisadora do Insper especializada em gênero.
— As mulheres têm diferentes experiências. Quando se observam outros eixos, como etnia, classe social, geração, vemos retratos diferentes. É importante entender que o avanço é muito mais lento do que se gostaria e que esse avanço não está trazendo todo mundo ainda. Não podemos deixar nenhuma para trás.
Segundo Ana, as mulheres negras estão mais concentradas no trabalho informal. Quando estão no emprego formal, são mais concentradas nos trabalhos sub-remunerados, menos protegidas ou na base da pirâmide. Seguem como raridade no topo da gestão das companhias, mas começam a ganhar espaço. Já para as mulheres brancas, mais favorecidas economicamente e na educação, o desafio é a ascensão, o teto de vidro que impede que elas avancem mais rapidamente.
Mesmo com o aumento de mulheres em cargos de liderança, chegando a quase 40%, Vivian Broge, vice-presidente de Relações Humanas e Marketing da Totvs, diz ainda se sentir sozinha nesses espaços dominados por homens:
— São poucas as mulheres em vice-presidências.
Nesses cargos de liderança, a desigualdade salarial é mais acentuada, afirma a economista do IBGE Cristiane Soares, pesquisadora de gênero. Na média, a mulher ganha cerca de 80% do que recebe o homem. Nos cargos de liderança, essa parcela cai para 73%:
— Quase 10% das mulheres em cargos de chefia estão na construção civil, são arquitetas, engenheiras, mestres de obras, mas elas só ganham 49% do salário do homem. E piorou, era 54% em 2013.
Essa ascensão desigual foi conseguida a custo de ter que provar permanentemente que merecia estar naquela posição. Carolina Buzetto, CEO da WPP Media Services, lembra que no início da carreira não havia modelo de liderança feminina:
— Sempre que havia uma mulher importante, um homem dava a palavra final. Não conseguia enxergar até onde minha carreira poderia ir.
Os avanços no ambiente corporativo vêm sendo impulsionados pela adoção de diversas medidas voltadas para promover a equidade de gênero, sobretudo no alto da pirâmide do trabalho. Programas de formação de liderança; bonificações ancoradas no cumprimento de metas de diversidade; iniciativas para recrutar e preparar talentos femininos para promoções estão entre elas.