ACÁCIO MORAES
BARRA MANSA, RJ (FOLHAPRESS)
Desde 2015, tem crescido o número de crianças que nunca receberam nenhuma vacina na vida. Aproximadamente 18 milhões de crianças não receberam a chamada dose zero, e mais da metade está concentrada em apenas oito países, entre eles o Brasil, Congo, Etiópia, Índia, Indonésia, Nigéria, Somália e Sudão.
Estima-se que em 1980 havia quase 60 milhões de crianças no mundo sem qualquer vacina. Em 2019, antes da pandemia de Covid-19, esse número caiu para 15 milhões, uma redução de 75%, mas desde então pouco progresso foi feito.
Os dados vêm de um estudo publicado na revista The Lancet, estimando a taxa de vacinação combinada contra difteria-tétano-coqueluche, vacina aplicada nos primeiros 2 meses de vida.
O estudo também mostra que a vacinação infantil parou de crescer desde 2010, afetando tanto países pobres como ricos. Em 21 dos 36 países mais desenvolvidos, as taxas de vacinação para diversas doenças caíram.
Os pesquisadores usaram dados globais de 204 países e técnicas estatísticas para analisar os efeitos da pandemia e possíveis viéses nos dados.
A vacinação dobrou desde 1980, reduzindo muito o número de casos de doenças evitáveis, mas a paralisação atual coloca em risco as metas da OMS para 2030: reduzir pela metade o número de crianças sem vacina e garantir proteção universal para doenças como coqueluche, difteria, tétano, meningite e sarampo.
A pandemia de Covid-19 agravou a situação, já que a demanda por recursos de saúde foi alta e outras áreas ficaram desassistidas.
No Brasil, apesar de ter um plano de vacinação sólido, desde 2015 houve queda constante na cobertura vacinal infantil, conforme o Anuário VacinaBR 2025, elaborado pelo Instituto Questão de Ciência e parceiros.
Casos de sarampo, caxumba, rubéola e outras doenças poderiam ser evitados com vacinação, mas as metas para 2023 não foram alcançadas. Oitenta por cento dos brasileiros vivem em cidades com baixa vacinação, e a taxa de abandono das vacinas aumentou — em algumas regiões mais da metade das crianças não completam as doses.
Carolina Lins, pesquisadora da UFMG, destaca que a população brasileira sempre aceitou vacinas, mas recentes mudanças refletem desinformação, notícias falsas e desigualdades sociais.
A distribuição das vacinas em um país grande como o Brasil é complexa, com dificuldades logísticas entre centros produtivos e regiões distantes. O racismo estrutural também dificulta que crianças negras e pardas tenham a vacinação completa.
Pesquisas nacionais indicam que mães negras enfrentam mais obstáculos para vacinar seus filhos, como distância dos postos, falta de tempo, transporte e até restrições no trabalho.
Joyce Carvalho Martins, neurologista pediátrica, enfatiza a segurança dos imunizantes disponíveis no país e destaca que não há ligação comprovada entre vacinas e autismo. Segundo ela, vacinar é proteger vidas.