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sábado, 27/12/2025

Cresce mineração de bitcoin no Brasil com benefícios fiscais e sem regras claras

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PEDRO S. TEIXEIRA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Projetos importantes de mineração de bitcoin estão se desenvolvendo no Brasil graças a isenções de impostos destinadas a data centers. Essa expansão acontece mesmo sem a existência de regras específicas no país sobre meio ambiente e segurança energética, algo que já ocorre na Europa e no Texas.

A mineração é um processo que consome muita eletricidade para resolver cálculos matemáticos necessários para validar transações de bitcoins. Quem decifra o código primeiro ganha uma criptomoeda como recompensa.

O projeto mais avançado, da Renova Energia, já conta com autorizações do Operador Nacional do Sistema (ONS) e licença ambiental do estado da Bahia. O investimento previsto é de US$ 200 milhões (R$ 1,09 bilhão) para construir uma infraestrutura com uma capacidade instalada de 100 megawatts, consumindo energia equivalente à de uma cidade com um milhão de habitantes.

O complexo, chamado Satoshi — que faz referência ao criador do Bitcoin e à menor fração da moeda — deve começar a funcionar em 2026, sendo exclusivamente dedicado à mineração.

A Renova fornece a infraestrutura física e energética e dá suporte técnico, enquanto um parceiro da área de criptomoedas gerencia a operação de mineração e a venda dos ativos. A identidade desse parceiro é mantida em sigilo devido a acordos contratuais.

Outras duas grandes geradoras de energia renovável também têm pedidos em andamento no ONS para conectar projetos similares. Atlas Renewable Energy e Serena Energia, com empreendimentos próprios, optaram por não comentar.

A empresa Tether, gigante no setor de criptomoedas, investe em mineração de bitcoins utilizando biometano em Mato Grosso do Sul.

Todos esses projetos contam com vantagens fiscais nos estados onde atuam e podem se beneficiar da política do governo Lula para data centers. Em 4 de março, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) incluiu máquinas de mineração no regime de ex-tarifário até 2027, que permite o ressarcimento do imposto de importação.

Esses incentivos foram dados antes mesmo da criação de regras que exijam critérios ambientais e energéticos para a atividade. A lei nº 14.478 de 2022, que regulou serviços com ativos virtuais como o bitcoin, previa inicialmente um artigo para incentivar o uso de energia renovável na mineração, mas essa parte foi retirada da versão final.

Pela alta demanda por energia, a segurança energética é uma questão central em legislações internacionais sobre mineração. No Brasil, geradores de energia renovável acreditam que a mineração pode ajudar a usar o excesso de energia em determinados horários, evitando apagões.

No Texas, maior polo de mineração dos EUA, unidades com mais de 75 MW precisam fornecer dados sobre localização e consumo, permitindo ao estado desligar equipamentos em emergências para proteger a rede.

Na Europa, mineradores têm que apresentar relatórios detalhados do consumo de energia e emissões de gases de efeito estufa.

A China, que já foi líder em mineração, proibiu as mineradoras devido ao alto consumo de energia e uso do carvão, além de riscos ao sistema financeiro.

Atualmente, as maiores mineradoras estão na Rússia, Uzbequistão e Cazaquistão, que combinam gás natural barato e controle regulatório fraco sobre criptomoedas.

No Brasil, o Regime Especial de Tributação para Serviços de Data Center (Redata) inclui a área de criptomoedas e concede vantagens fiscais condicionadas ao cumprimento de normas ambientais. Data centers atendem várias funções, desde inteligência artificial até mineração.

Com essa política, equipamentos importados para data centers ficam isentos de tributos federais. A medida provisória de 18 de setembro expira em 25 de fevereiro, caso não seja aprovada pelo Congresso.

O diretor de novos negócios da Renova Energia, Sandro Yamamoto, considera o Redata importante para futuros projetos e expansão do setor.

A Renova também recebe isenção de ICMS pela Secretaria Estadual da Fazenda da Bahia para contratos de energia e serviços de TI.

A Tether tem benefício fiscal similar em Mato Grosso do Sul. A Confederação Nacional da Indústria (CNI), presidida por Ricardo Alban, que é conselheiro da Renova, pediu a inclusão dos data centers de criptomoedas no Redata. Para a CNI, o estímulo deve ser para negócios independentemente da função, seja inteligência artificial ou mineração.

Jefferson Gomes, diretor de desenvolvimento industrial, tecnologia e inovação da CNI, explicou que o foco é atrair negócios, independentemente da finalidade dos servidores.

O professor da USP Ildo Sauer, especialista em infraestrutura elétrica, ressalta que a energia deve ser usada para promover desenvolvimento econômico e emprego, alertando para os riscos ambientais e falta de progresso local.

Outra preocupação é o uso de criptomoedas para lavagem de dinheiro. O delegado da Polícia Civil de Goiás e professor da Escola Nacional de Defesa Cibernética, Vytautas Zumas, afirma que a lei 14.478 e resoluções do Banco Central que entrarão em vigor em fevereiro exigem que empresas reportem transações, ajudando a combater essas práticas.

Atualmente, a Receita Federal exige declaração e pagamento de impostos sobre ganhos da mineração, mas depende da transparência dos mineradores.

Zumas observa que operações fora do país ou com intermediários desconhecidos ainda são difíceis de rastrear, comparando a situação ao dólar-cabo, uma forma ilegal de enviar dinheiro ao exterior.

A Tether, que mantém grandes operações na África e no Uruguai e planeja expandir para o Brasil em 2026, afirma seguir critérios rigorosos de compliance, combinando transparência e controles para evitar uso indevido da infraestrutura.

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