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sexta-feira, 05/12/2025

Correios: problema na auditoria persiste desde o começo do ano

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O balanço financeiro dos Correios referente ao terceiro trimestre de 2025 revela um prejuízo acumulado de R$ 6,05 bilhões até setembro, incluindo uma ressalva feita pela auditoria independente, presente também no relatório do primeiro semestre e ainda sem solução pela empresa estatal.

Os Correios informaram ao Estadão que suas demonstrações contábeis seguem a legislação e normas vigentes, sendo examinadas por auditoria independente de acordo com padrões brasileiros e internacionais.

Este é o terceiro trimestre consecutivo em que o relatório menciona que, devido a apontamentos da auditoria e avaliações dos órgãos de controle, está em andamento uma revisão das estimativas e riscos relacionados a processos judiciais pela Assessoria Jurídica da empresa.

Se essa revisão confirmar subestimação dos riscos, será necessária uma provisão financeira maior para possíveis perdas judiciais, o que pode ampliar ainda mais o prejuízo atualmente bilionário.

Comparado ao final de 2024, o valor reservado para processos judiciais subiu, chegando a R$ 5 bilhões em setembro, contra R$ 2,72 bilhões no quarto trimestre de 2024.

Os processos trabalhistas são uma grande preocupação, com o balanço destacando a análise das estimativas sobre o Acúmulo de Adicional de Atividade de Distribuição e/ou Coleta Externa (AADC) com o Adicional de Periculosidade (AP), considerando decisões judiciais pendentes e outras questões jurídicas em avaliação.

O relatório aponta que impactos dessa revisão poderão aparecer nas próximas demonstrações contábeis conforme avançam as análises técnicas.

Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que os Correios são a maior empresa litigante trabalhista do Brasil, com 56.481 novos casos em 12 meses, o que equivale a 154 ações por dia.

Diferente de grandes companhias que contratam as quatro maiores auditoras do mundo, os Correios utilizam a Consult Auditores, uma empresa menos conhecida, com sede em Curitiba e filial em Cascavel, no Paraná.

O que dizem os especialistas sobre os relatórios

Especialistas consultados pelo Estadão destacam o baixo detalhamento das informações no balanço, que não inclui notas explicativas da auditoria nem o nome da empresa responsável.

Magali Camazano, auditora e consultora, explica que os riscos em processos judiciais devem ser classificados como possíveis, prováveis ou remotos. A empresa faz provisão financeira quando a perda é provável, o que afeta o resultado financeiro, especialmente em empresas com dificuldades econômicas. Riscos possíveis podem ser mencionados sem reserva financeira.

O relatório de auditoria do terceiro trimestre, disponível no site dos Correios, aponta avanços na classificação dos riscos, mas ainda encontra pontos que precisam de melhorias nos critérios e controles internos, o que pode afetar os valores relacionados a processos judiciais e passivos contingentes.

Relatórios anteriores registraram fragilidades nos critérios e controles adotados.

A Consult Auditores alegou impedimentos legais para não divulgar informações sobre seus clientes.

Situação financeira preocupante

É importante compreender que uma ressalva na auditoria indica possíveis problemas na confiabilidade dos dados, ao passo que uma ênfase destaca aspectos que podem representar problemas financeiros ou resultados favoráveis.

Desde 2017, com a adoção de novas normas internacionais, o termo ressalva foi rebatizado como “opinião modificada”, mas a auditoria dos Correios ainda utiliza a expressão antiga.

Uma das ênfases identifica déficit no custeio global do plano de saúde pós-aposentadoria, apontado pelos cálculos atuariais.

Desalinhamento entre receitas e despesas

Especialistas analisam que um dos principais motivos para os prejuízos bilionários é o descompasso entre aumento de gastos operacionais, principalmente com reajustes de benefícios dos empregados, e a redução das receitas, devido à concorrência e à implementação da taxa das blusinhas.

Márcio Holland, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EESP) e ex-secretário de política econômica, comenta que a deterioração financeira é acelerada e antecipada, destacando a forte elevação dos custos com pessoal e benefícios na expectativa de crescimento das receitas.

Os benefícios pagos a empregados cresceram de R$ 2,79 bilhões, no quarto trimestre de 2024, para R$ 4,97 bilhões no terceiro trimestre de 2025, um aumento de quase R$ 2,2 bilhões.

A receita líquida entre janeiro e setembro de 2025 foi de R$ 12,34 bilhões, contra R$ 14,15 bilhões no mesmo período de 2024, uma queda de cerca de R$ 1,8 bilhão.

Holland afirma que o passivo está consumindo ativos que estão diminuindo, somado ao aumento de benefícios pouco comuns no setor privado e à queda de receitas, resultando em um prejuízo estimado em R$ 4 bilhões. Ele também cita a necessidade do pagamento de precatórios e a perda de cerca de R$ 2 bilhões anuais devido ao fim do monopólio postal e à taxa das blusinhas, enfatizando a falta de uma gestão mais cautelosa.

O plano de reestruturação dos Correios inclui programa de demissão voluntária de pelo menos 10 mil funcionários, venda de imóveis, renegociação de contratos e busca por novas receitas. Holland alerta que, embora necessário, o programa não é suficiente para resolver o déficit e pode aumentar custos no curto prazo.

A proposta também prevê empréstimo de R$ 20 bilhões com garantia do Tesouro Nacional, porém o aporte foi rejeitado pelo Tesouro por conta das altas taxas de juros.

Estadão Conteúdo

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