A frota clandestina da Rússia consiste em uma rede secreta de petroleiros, principalmente os mais antigos, com uma estrutura complicada de propriedade. Essa frota permite que Moscou evite as sanções econômicas impostas pela União Europeia (UE), Estados Unidos e Reino Unido em resposta à invasão da Ucrânia, iniciada em fevereiro de 2022.
Esta frota é caracterizada pelo uso de bandeiras de conveniência, mudanças frequentes de nome e bandeira, desligamento temporário do sistema de rastreamento AIS, uso de seguradoras fictícias e transferências de carga no mar, o que impede a atracação em portos.
Esses navios já operavam antes do conflito na Ucrânia e também são utilizados por países como Irã e Venezuela para evitar sanções dos EUA, além da Coreia do Norte. Desde a invasão da Ucrânia, a frota clandestina aumentou significativamente, com o think tank Atlantic Council estimando que 17% dos petroleiros pertençam a essa rede.
Estima-se que a frota clandestina russa tenha mais de 900 petroleiros. Embora a UE tenha sancionado 444 desses navios, a falta de atracação em portos europeus dificulta a ação contra as tripulações. Essa rede gera bilhões de euros para financiar cerca de 40% do esforço de guerra russo.
Novo episódio na França
Em 27 de setembro, a Marinha da França interceptou o petroleiro Pushpa, ligado à frota clandestina, próximo a Saint-Nazaire. O navio, suspeito de facilitar o lançamento de drones perto de aeroportos na Dinamarca, trocou sua bandeira 13 vezes em três anos. O capitão chinês e o primeiro oficial foram detidos temporariamente.
O presidente Emmanuel Macron qualificou o episódio como uma séria violação e solicitou uma coalizão para combater a frota clandestina, destacando que deter esses navios pode enfraquecer essa prática. A base legal para a interceptação foi a irregularidade na bandeira e registro, que permitem a ação em alto mar.
O Pushpa partiu da Rússia em 20 de setembro e deveria chegar à Índia em 20 de outubro, mas ficou ancorado na costa francesa por vários dias. Registrou passagem próxima à costa da Dinamarca durante os supostos ataques de drones que afetaram o tráfego aéreo em Copenhague.
Riscos e desafios da frota clandestina
Essa frota apresenta riscos ambientais e de segurança devido à idade avançada dos navios, aumentando as chances de falhas, colisões e derramamentos de petróleo. Mais de 72% dos petroleiros clandestinos têm mais de 15 anos, segundo o Centro de Pesquisas em Energia e Ar Limpo (Crea).
O Reino Unido relata que esses navios realizam atividades ilegais para escapar das sanções, incluindo desativar sistemas de rastreamento e evitar seguros adequados contra riscos como guerras e acidentes. A maioria do mercado de seguros está na UE e Reino Unido, que impuseram sanções rígidas.
Acusações contra a frota incluem navegação perigosa, manipulação do AIS e até sabotagem de cabos submarinos. Contudo, ações legais enfrentam limitações, como evidenciado pelo caso do petroleiro Eagle S, onde a jurisdição foi contestada.
Sanções econômicas e esforços internacionais
A UE implementou pacotes de sanções e um teto de preço para o petróleo russo, limitando a 47,60 dólares por barril o comércio na Europa desde dezembro de 2022. Essa medida visa impedir que transportadoras e seguradoras atuem com preços acima do limite.
Apesar disso, mercados como China e Índia continuam comprando, mantendo lucrativas as rotas de evasão para a Rússia. Sanções secundárias contra refinarias, comerciantes e portos são discutidas, mas ainda não aplicadas pela UE, apesar do apoio dos EUA.
Medidas da UE e Otan
Além de sanções econômicas, a UE aumentou a abrangência das proibições a navios e serviços. Um 19º pacote de sanções em avaliação pretende endurecer ainda mais as ações.
A Otan lançou a missão Sentinela do Báltico para aumentar a presença no Mar Báltico e proteger infraestruturas críticas subaquáticas. Países da região, como Suécia, intensificam a vigilância costeira, especialmente após incidentes com drones.
A Agência Europeia de Segurança Marítima coleta dados de satélite para detectar derramamentos e atividades suspeitas, ajudando os controles nacionais. Desde 2023, UE e Otan mantêm uma força-tarefa conjunta e uma célula de coordenação para fortalecer a proteção da infraestrutura submarina vital.
No entanto, até o momento, essas iniciativas não foram suficientes para impedir que a frota clandestina russa opere de modo lucrativo e arriscado.