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quarta-feira, 16/07/2025

Como melhorar o foco para combater a crise de atenção dos jovens

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O texto foi elaborado pela doutoranda em educação Andriessa Santos e pela pedagoga e pesquisadora em comunicação Patrícia Leite, ambas do Instituto Singularidades, e divulgado na plataforma The Conversation Brasil.

Jamais na história nossa atenção foi tão disputada. Plataformas sociais, apps e empresas tecnológicas buscam nos manter conectados com sistemas que capturam nosso tempo para lucro. Essa pressão prejudica a memória, o aprendizado e a saúde mental.

A dificuldade para manter o foco, muitas vezes confundida com falhas de memória, mostra um estilo de vida cansativo, com estímulos contínuos e sem descanso. Para superar isso é preciso ter intenção e ambientes que estimulem a concentração, o silêncio e o pensamento crítico. Em uma época de dispersão, pensar sobre a função da atenção no dia a dia e na aprendizagem é crucial para recuperar a concentração, o bem-estar e a habilidade de aprender com significado.

A hiperconexão acelerou nosso ritmo, causando ansiedade e problemas de saúde. O filósofo e urbanista francês Paul Virilio (1932-2018) chamou essa urgência de “Dromologia”, o impacto da velocidade na vida humana. Virilio escreveu vários livros sobre as tecnologias da comunicação.

Crianças e adolescentes estão cada vez mais exaustos, dormem mal e se sentem isolados. O filósofo e psicólogo social Jonathan Haidt, em seu livro A Geração Ansiosa, mostra como a “infância ligada ao celular” reduz o tempo livre, a imaginação e o brincar. Meninas enfrentam pressão para aprovação; meninos se refugiam em videogames e pornografia. Isso gera uma geração fragilizada que necessita de cuidado, calma e foco.

Segundo estudos de Haidt, entre 2010 e 2015, com o uso mais frequente dos smartphones, a depressão entre meninas nos EUA dobrou e a automutilação quase triplicou. Jovens que passam mais de três horas diárias nas redes sociais têm o dobro do risco de ansiedade e depressão, intensificado pelo uso precoce, que torna o cérebro vulnerável à dependência da aprovação social.

Essa realidade também é mostrada na minissérie Adolescência (Netflix), onde uma personagem de 13 anos sofre bullying e cyberbullying, tem o sono atrapalhado por notificações e vive dispersa e isolada mesmo dentro de casa. Isso revela a necessidade urgente de criar espaços de calma, escuta e presença para evitar perder tempo de qualidade, a capacidade de imaginar e relações genuínas.

A lógica dos feeds infinitos e microrecompensas dificulta o foco profundo, a reflexão e o pensamento crítico. Um cérebro fragmentado fica mais suscetível à manipulação e menos apto a análises complexas.

Em resumo, por estarem expostos a comparações digitais e à constante captação da atenção por dispositivos eletrônicos, crianças e jovens estão ansiosos e acelerados, sofrendo uma sobrecarga que nenhum cérebro suporta.

Atenção e aprendizado

A atenção vai além da concentração; é cuidado, respeito e presença, um ato de afeto. A palavra vem do latim attendere, que significa “estar presente”, e relaciona-se historicamente com o foco em algo importante, como o conhecimento ou Deus.

Para o filósofo e psicólogo americano do século 19 William James, “focalização, concentração da consciência são sua essência”. Isso significa deixar algumas coisas de lado para se dedicar efetivamente a outras, um processo crucial para o aprendizado, pois sem atenção o cérebro não filtra estímulos nem cria memórias duradouras.

Em 1971, o economista Herbert Simon afirmou que “uma riqueza de informação cria uma pobreza de atenção”. O excesso de dados compete com nossa capacidade limitada de foco, tornando essencial saber para onde direcioná-la. A atenção pode ser guiada por professores, contextos ou perguntas instigantes, ativando processos cerebrais que consolidam novas conexões.

O psicólogo cognitivo Héctor Ruiz Martín destaca que a atenção ativa fortalece conexões cerebrais e facilita a memória de longo prazo. Portanto, a qualidade do foco influencia o quanto aprendemos e aplicamos.

Ambientes favoráveis

Cultivar a atenção é a porta de entrada para qualquer aprendizado, exigindo cuidado, intencionalidade e escolhas pedagógicas. A médica e educadora italiana Maria Montessori, pioneira da pedagogia moderna, reconheceu isso ao criar os “ambientes preparados”: espaços organizados com materiais sensoriais e móveis acessíveis, que incentivam a exploração livre e o foco contínuo. Nesses espaços, a criança desenvolve os circuitos neurais do controle da atenção, aprendendo a conduzir sua própria curiosidade com a mediação atenta do educador.

O neurocientista francês Stanislas Dehaene considera a atenção como o primeiro dos quatro pilares da aprendizagem, fundamental para o processamento profundo do conhecimento. Ela se soma ao engajamento ativo, feedback de erros e consolidação.

Esses pilares são interdependentes. Sem atenção, nada é registrado. Ela abre caminho para o engajamento, que torna a aprendizagem um processo ativo. O feedback de erros fortalece conexões quando retorna durante o aprendizado, e tudo se consolida com descanso e sono, fixando o que foi aprendido.

Haidt observa que o mundo digital prejudica esse ciclo. Notificações frequentes quebram o foco, substituem o engajamento profundo por respostas superficiais e ainda atrapalham o sono, essencial para consolidar aprendizagem. Isso resulta em um cérebro hiperestimulado e desconectado dos processos que sustentam o aprendizado.

Mudar esse quadro é urgente. Pensadores como Paulo Freire e John Dewey reforçam que o interesse do aluno é o motor do conhecimento, o que exige redesenhar o cotidiano escolar com ambientes que promovam o diálogo, base da educação freireana.

Também são recomendadas pausas para respiração consciente, estações com materiais manipuláveis, interações com feedback imediato e especialmente ambientes sem telas, onde haja descanso, integração e troca de experiências, favorecendo a atenção.

O cérebro é plástico e se adapta ao ambiente. Contextos que equilibram liberdade e estrutura, ação e pausa, concentração e descanso, criam terreno fértil para que a curiosidade vire reflexão e a reflexão, aprendizagem significativa.

Como melhorar o foco

Apesar dos avanços da neurociência, faltam estudos que relacionem atenção e aprendizagem em diversos contextos no Brasil. Ainda assim, professores criam, na prática, pequenos laboratórios em sala, onde observam, testam e revêem estratégias que aprimoram seu conhecimento e fortalecem a atenção dos alunos.

A atenção é uma habilidade que se aprende e constrói nas relações e no sentimento de pertencimento oferecido pela escola. Fanny Sznelwar Minerbo, especialista em desenvolvimento de metodologias e projetos, e Beatriz Peres Rios, professora de projetos de humanidades, defendem que desenvolver foco exige práticas intencionais: rotina clara, ambientes organizados, materiais acessíveis e estratégias que acolhem diferentes perfis, como uso de mensagens para reforçar etapas.

Elas também sugerem preparar o cérebro com respiração guiada, música calma, pausas e o uso do método Pomodoro. Valorizam as Rotinas do Pensamento (Project Zero – Harvard) como práticas que organizam o raciocínio, aprofundam a atenção e favorecem o pensamento crítico.

A atenção não surge por comando, mas de um ciclo que envolve organização, relações, regulação emocional e construção de sentido. Para promover a atenção é preciso criar experiências que combinem vínculo, participação e sentido, bases essenciais para uma aprendizagem viva e significativa.

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