CRISTIANE GERCINA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) alcançou maioria em um julgamento virtual visando padronizar as regras da perícia para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) a pessoas com deficiência, tanto no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) quanto na Justiça.
O BPC é um auxílio assistencial equivalente a um salário mínimo, destinado a idosos acima de 65 anos e a pessoas com deficiência que estejam em famílias de baixa renda.
Para ter direito ao benefício, além de comprovar que a renda por pessoa da família é igual ou inferior a um quarto do salário mínimo, o beneficiário com deficiência deve passar por perícia médica. No INSS, essa perícia é mais abrangente, levando em conta também as condições sociais, conhecida como perícia biopsicossocial.
A proposta de unificação da perícia biopsicossocial foi apresentada pelo ministro Luís Roberto Barroso, presidente do CNJ. O objetivo é que as normas sejam as mesmas para os dois órgãos, reduzindo assim a judicialização, considerada pelo Ministério da Fazenda do governo Lula como um fator que pressiona as contas públicas.
A Justiça tem aumentado as decisões favoráveis aos segurados que recorrem para obter o BPC, mesmo em casos em que a perícia não atesta deficiência ou incapacidade para a vida social e laboral.
“É recomendável a adoção de um instrumento de avaliação comum entre as esferas judicial e administrativa, para facilitar a identificação de eventuais divergências”, afirma o relatório de Barroso, baseado no trabalho de um grupo formado em 2024 para avaliar a concessão do BPC.
O voto de Barroso foi apoiado por 11 ministros do CNJ, restando apenas a manifestação de três. A conclusão do julgamento está prevista para o dia 30 de março.
O ministro questiona a ideia de que a Justiça tem sido permissiva nas concessões. “Dados do portal Justiça em Números mostram que as concessões judiciais do BPC para pessoas com deficiência aumentaram entre 2020 e 2024, mas de forma proporcional ao crescimento das concessões administrativas”, explica em seu relatório.
O aumento significativo se deu no número de pedidos, que quase quadruplicou: de 153.049 ações em 2020 para 587.775 em 2024. O número de julgamentos também cresceu de 121.536 em 2020 para 485.529 em 2024.
O percentual de pedidos aceitos reduziu de 29% em 2020 para 23% em 2024. Se aprovada, a unificação das regras deve entrar em vigor em 2 de março de 2026. No caso do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que já possui perícia unificada, a mudança deverá ocorrer até 60 dias após a decisão.
Para a professora da Fundação Getulio Vargas e advogada Tonia Galetti, do escritório Tonia Galetti Advocacia, a medida apresenta dois aspectos: “Por um lado, traz maior segurança jurídica, mesmo que o segurado acabe recebendo uma resposta negativa. Por outro lado, existe a possibilidade de concessão após uma negativa do INSS“, explica.
Ela ressalta que os erros na perícia são comuns e que o juiz, ao avaliar o benefício, pode considerar outros aspectos além da perícia médica, inclusive a questão social, conforme acontece no INSS.
Conforme a legislação do BPC, é considerada pessoa com deficiência aquela cuja condição impede a vida independente e o trabalho, sendo incapacidade um fenômeno multidimensional que envolve limitações em atividades e participação social.
O relatório de Barroso utiliza a definição da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que considera pessoas com deficiência aquelas que têm impedimentos de longo prazo, físicos, mentais, intelectuais ou sensoriais, que, combinados com barreiras, dificultam sua plena participação na sociedade em condições de igualdade.
Dados recentes mostram que, em 2024, o BPC beneficiou 6,4 milhões de pessoas, representando um aumento de 10% em relação ao ano anterior, que já tinha tido crescimento de 11% sobre o ano anterior.