IDIANA TOMAZELLI
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
A Controladoria-Geral da União (CGU) encontrou falhas significativas no sistema que os Correios usam para controlar suas ações judiciais. A CGU também identificou uma manobra contábil que diminuiu a dívida da empresa em R$ 1 bilhão nas demonstrações financeiras de 2023.
Os Correios negaram qualquer irregularidade, mas admitiram outros problemas que foram atribuídos à gestão da empresa no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A empresa não respondeu até a publicação deste texto.
O relatório da CGU revelou que a empresa reduziu uma dívida trabalhista de R$ 1,032 bilhão para apenas R$ 18, justificando que outra ação judicial poderia gerar um ganho quase do mesmo valor. Essa prática continuou em 2024.
Os auditores consideraram esse tipo de compensação inadequada, pois ela reduz a transparência dos registros contábeis.
Segundo o documento, diferentes fatos contábeis devem ser registrados separadamente para mostrar com clareza os impactos financeiros da empresa.
Essa compensação entre valores diferentes pode esconder o verdadeiro impacto das operações e prejudicar a clareza das informações.
Como reportado pela Folha, a falta de controle dos Correios sobre ações judiciais piorou sua situação financeira. A empresa fechou um empréstimo de R$ 12 bilhões para seu plano de reestruturação e acumula um prejuízo de R$ 6,1 bilhões até setembro deste ano.
A controvérsia gira em torno de uma ação trabalhista que pede o pagamento combinado de dois adicionais: AADC (atividade de distribuição e coleta) e AP (periculosidade para motociclistas).
Em 2014, após regulamentação do adicional de periculosidade, os Correios suspenderam o pagamento do AADC, gerando várias ações judiciais. Os Correios também pediram a nulidade da portaria do Ministério do Trabalho que instituiu o adicional.
Em 2021, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) confirmou o direito ao acúmulo dos dois adicionais. Porém, em janeiro de 2024, os Correios conseguiram uma liminar para suspender os efeitos da portaria do adicional de periculosidade, base para a redução da provisão contabilizada.
A CGU apontou dois problemas importantes: a compensação inadequada e a demora dos Correios em classificar corretamente o risco da ação trabalhista e calcular os valores envolvidos.
Em outubro de 2022, uma decisão manteve uma classificação errada do risco da ação e a dívida estava subavaliada em R$ 614 milhões. Só em fevereiro de 2023, a dívida foi reconhecida corretamente com um valor de R$ 627 milhões.
A auditoria interna dos Correios reconheceu falhas no controle das ações trabalhistas, fiscais e cíveis, encaminhando o assunto à corregedoria para avaliação de possíveis processos disciplinares. A empresa não respondeu sobre investigações internas.
Os auditores destacaram que as ações tramitam em diferentes ramos da Justiça e que ainda existem dúvidas sobre a vitória da empresa na ação que tentou anular a portaria do Ministério do Trabalho.
As normas contábeis exigem prudência e o reconhecimento de perdas prováveis no passivo, mas ganhos só podem ser contabilizados se forem quase certos. A CGU afirmou que a compensação usada implicava reconhecer um ativo incerto, o que não é permitido.
Além disso, para ser correto, todos os valores deveriam ser registrados separadamente, mantendo o passivo de R$ 1,032 bilhão e incluindo um ativo correspondente, o que não aconteceu.
Também foram encontradas falhas nos cálculos, que não avaliaram cada funcionário separadamente e apresentaram certa arbitrariedade. A empresa chegou a um saldo positivo de R$ 16,5 milhões após a compensação, mas o passivo foi reduzido a R$ 18 devido a limitações técnicas no sistema contábil.
Os Correios argumentaram que o registro contábil reflete a melhor estimativa do gasto da empresa, afirmando que não se espera saída de recursos para liquidar a obrigação.
A empresa falou sobre a criação de dois grupos de trabalho: um para modernizar o sistema jurídico e outro para revisar a cartilha de contingência, com o objetivo de melhorar relatórios e incluir políticas para responsabilizar advogados.
Correto monitoramento das ações judiciais tem sido uma preocupação do conselho de administração da empresa. Em 2025, o conselho autorizou a compra de software específico e cobrou melhorias na atuação do departamento jurídico, especialmente na defesa em ações trabalhistas. Também pediu agilidade na contratação de consultoria jurídica especializada.
Segundo representantes dos Correios, a gestão do passivo judicial está sendo mais bem feita e para 2026 a conta deve chegar a R$ 1,3 bilhão.

