ALEX SABINO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
A inauguração de um terminal para cargas refrigeradas chega em um momento crucial para o Ceará. Com as exportações de pescados e outros alimentos congelados para os Estados Unidos paradas em função das tarifas impostas por Donald Trump, armazenar as mercadorias enquanto a situação não se resolve ou até encontrar novos mercados externos garante mais tempo aos produtores.
“É uma forma de ajudar os exportadores do Ceará a prolongar a conservação dos produtos enquanto os governos tentam solucionar esse problema. Os produtores também podem redirecionar os produtos para o mercado interno. Estamos guardando os pescados que não podem ser enviados aos Estados Unidos”, explica Thiago Abreu, diretor-geral da Fracht Log, terminal de cargas frias no porto de Pecém, perto de Fortaleza.
O terminal, operado por uma empresa suíça, foi aberto no mês passado. Para otimizar o espaço, diferentes tipos de produtos refrigerados estão sendo colocados juntos nos contêineres, aguardando definição do cenário.
“O projeto foi apresentado no Pecém no final de 2021, quando vimos que a economia global estava instável devido aos custos de frete. Agora enfrentamos o desafio das tarifas”, acrescenta.
O Ceará é o estado brasileiro mais afetado proporcionalmente pela sobretaxa de 50% aplicada por Donald Trump às exportações brasileiras.
No início do mês passado, o governador Elmano Freitas (PT) decretou situação de emergência devido aos impactos econômicos dessas tarifas.
Até a entrada em vigor dessas barreiras, em 2025, os Estados Unidos recebiam 52% das exportações do Ceará, percentual que cresceu 7% em comparação a 2024. Apenas 1,38% das vendas foram isentas da tarifa anunciada posteriormente.
Em agosto, as exportações para os EUA diminuíram 46,3% em relação a julho.
As tarifas afetam principalmente cidades que dependem da exportação de água de coco, castanha, frutas, mel e pescados para os Estados Unidos, gerando milhares de empregos diretos e indiretos.
A maior parte das exportações taxadas diz respeito ao aço da AcelorMittal (70%): US$ 414 milhões.
“Na indústria do aço, todos são taxados igualmente, a concorrência se mantém. Mas existem US$ 130 milhões em produtos como pescados, sucos, cereais, calçados, castanha de caju, frutas e água de coco que também são afetados”, revela Ricardo Cavalcante, presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec).
“Os setores menores enfrentam os maiores problemas. A safra da castanha começa em três meses e é colhida ao longo do ano, envolvendo cerca de 50 mil trabalhadores. A cera de carnaúba, produzida majoritariamente no Ceará, Piauí e Maranhão, sustenta 150 mil pessoas em um setor centenário”, completa.
O Ceará é o maior exportador mundial de pescados, incluindo lagosta, atum e peixes vermelhos, com toda a produção destinada aos Estados Unidos. Segundo dados da Fiec, são 18 mil pescadores. Contando a cadeia produtiva em terra, o número de trabalhadores chega a 60 mil.
Buscar novos mercados é uma prioridade do governo estadual, mas não é tarefa simples.
“Estamos tratando de alimentos pescados em águas mornas. Não é possível exportar para a China, onde as águas são frias, e existem questões sanitárias. Entrar em um novo país leva de cinco a seis meses, não acontece da noite para o dia”, explica Ricardo Cavalcante.
O setor privado alertou o governo cearense sobre os impactos econômicos. Empresas de logística como a Fortallog relataram queda no volume de cargas. A JM Negócios Internacionais, consultoria em comércio exterior, informou que transportadoras e operadores portuários também foram afetados.
“Mesmo antes das tarifas serem confirmadas, reunimos empresas para ajustamentos. O estado busca facilitar a abertura para novos mercados e mantém diálogo entre setor público, privado e acadêmico”, afirma Fabrício Gomes, secretário da Fazenda do Ceará.
O governo implementou incentivos fiscais, apoio econômico e o pagamento de crédito de exportação acumulado. O estado reembolsa 40% do imposto cobrado pelos EUA para empresas comprovadamente prejudicadas, via recursos financeiros ou abatimento de outros tributos.
Além disso, o Ceará compra parte da produção de pescados e castanha de caju para a merenda escolar e o programa Ceará Sem Fome.
