NATHALIA GARCIA E RICARDO DELLA COLETTA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
Para enfrentar as tarifas impostas pelo governo Donald Trump, o Brasil está buscando firmar novos acordos comerciais e reativar negociações antigas, com o objetivo de ampliar suas parcerias e compensar eventuais perdas no mercado dos Estados Unidos.
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva planeja formalizar a retomada das negociações do acordo comercial do Mercosul com o Canadá no final de agosto, durante a visita do ministro canadense de Comércio Internacional, Maninder Sidhu, a Brasília.
Este anúncio depende de consultas com os países do Mercosul — Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia —, sendo o Brasil o responsável por coordenar as negociações pelo lado sul-americano.
As reuniões entre as equipes negociadoras estão suspensas há cerca de quatro anos. A intenção é realizar uma nova rodada de conversas ainda no segundo semestre, durante a presidência rotativa do Brasil no Mercosul.
As negociações para um acordo de livre comércio entre Mercosul e Canadá pararam desde 2021, por diversos motivos, como a pandemia de Covid-19 e divergências políticas entre os governos brasileiros e canadenses anteriores.
A chegada de Donald Trump à presidência dos EUA mudou o cenário, aumentando a percepção em Ottawa e Brasília sobre a necessidade de diversificar fornecedores e reduzir barreiras comerciais. Essa preocupação é ainda maior para o Canadá, que destina mais de 70% das suas exportações para os EUA.
Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior do MDIC, afirmou que a visita do ministro canadense será uma oportunidade para avançar em temas como segurança alimentar, acesso a mercados e investimentos sustentáveis.
Segundo ela, o Canadá e o Mercosul compartilham princípios como sustentabilidade, comércio justo e multilateralismo, abrindo espaço para progresso nessa agenda.
Gustavo Ribeiro, gerente de inteligência de mercado da ApexBrasil, aponta que o Canadá é um mercado com padrões de consumo próximos aos dos EUA e que existe um alinhamento sobre energia limpa entre os países.
Ele destaca que o país pode ser um parceiro interessante para produtos diversos e para investimentos, especialmente na transição energética.
O Canadá é fornecedor importante de adubo para o Brasil, potencial que pode ser ampliado diante de possíveis sanções de Trump contra importações de produtos russos, como ocorreu com a Índia.
O governo brasileiro estimou que o acordo Mercosul-Canadá poderá gerar um impacto positivo de R$ 4,14 bilhões no PIB e um aumento de R$ 1,39 bilhão em investimentos até 2041, além de estimular importações e exportações.
As negociações devem levar mais de um ano para serem concluídas, considerando sua complexidade. Um membro do governo destaca a necessidade de os países se posicionarem rapidamente no comércio global.
Além disso, o governo Lula pretende se aproximar do México, atualmente com altos impostos nos EUA, para fortalecer a integração econômica regional.
Em discurso no Conselhão, Lula anunciou que o vice-presidente Geraldo Alckmin viajará ao México em agosto com uma delegação empresarial para discutir sustentabilidade, inovação e integração regional.
Outra prioridade é concluir ainda este ano as negociações com os Emirados Árabes Unidos, que estão avançadas. O objetivo é eliminar tarifas e facilitar a circulação de investimentos e serviços.
Tatiana Prazeres avalia que o acordo abrirá novas oportunidades para exportações brasileiras, especialmente em alimentos, máquinas e serviços, além de atrair investimentos em infraestrutura e inovação.
O principal desafio é alinhar regulamentos e equilibrar interesses para obter acesso a mercados em setores estratégicos, para ambos os lados.
Os Emirados são um mercado promissor para construção civil, carnes e castanhas brasileiras.
O governo também espera assinar em setembro o acordo Mercosul-Efta, aumentando o acesso preferencial a países europeus com alto poder aquisitivo, como Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein.
Gustavo Ribeiro destaca que produtos brasileiros sustentáveis e sofisticados poderão ganhar espaço nesses mercados.
O governo projeta que o Mercosul-Efta terá impacto positivo de R$ 2,69 bilhões no PIB e atrairá R$ 660 milhões em investimentos até 2044, com aumentos nas importações e exportações.
A pressão tarifária de Trump também fortaleceu a expectativa para o acordo entre Mercosul e União Europeia.
Tatiana Prazeres afirmou que o novo contexto internacional destaca a importância de parcerias baseadas em regras claras e confiança, e espera a assinatura do acordo até o fim do ano.
Há no Brasil a avaliação de que a guerra comercial e descontentamento europeu com acordos EUA-UE podem ajudar a superar resistências, especialmente da França, ao tratado com o Mercosul.
Thierry Besse, presidente da Câmara de Comércio França-Brasil, considera os recentes eventos como catalisadores para o acordo Mercosul-UE, ressaltando a urgência e importância do tratado para a diversificação comercial dos blocos.
Ele ressalta que o maior benefício será a integração das cadeias produtivas entre os dois blocos econômicos a longo prazo.