CLÁUDIA COLLUCCI
DUBLIN, IRLANDA (FOLHAPRESS)
Se o Brasil conseguisse diminuir a quantidade de fumantes em apenas 1%, poderia economizar cerca de R$ 24,8 bilhões por ano nos gastos diretos e indiretos provocados pelo tabagismo, revela uma nova ferramenta apresentada no congresso internacional de controle do tabaco realizado em Dublin, Irlanda.
Essa ferramenta digital, disponível no novo Atlas do Tabaco, mostra como os governos podem aumentar impostos sobre produtos do tabaco para gerar receita, diminuir o número de fumantes, aumentar a produtividade econômica e poupar milhões em despesas médicas relacionadas ao uso do tabaco.
Desenvolvida pela equipe de economia da saúde da Universidade Johns Hopkins, Vital Strategies e American Cancer Society, a ferramenta chamada Estimador de Recuperação de Custos e Receitas (Corre) utiliza dados atuais de mais de cem países para calcular o potencial de arrecadação tributária em diferentes cenários.
No Brasil, o modelo considera uma média de 11% de pessoas que fumam e um gasto total de R$ 334,1 bilhões entre tratamentos médicos, perda de produtividade e mortes relacionadas ao tabagismo. Considera ainda o preço médio do maço de cigarro em R$ 5,50 com uma taxa total de 4,4%.
Em um cenário moderado, para baixar o índice para 10%, o preço sugerido do maço subiria para R$ 8 com impostos de 6,9%. Dessa forma, a arrecadação crescerá em torno de R$ 3,6 bilhões, enquanto que os gastos associados ao tabagismo seriam reduzidos em quase R$ 25 bilhões.
Organizações como a OMS, The Union e especialistas de diversos países defendem a elevação dos impostos sobre o tabaco como uma das medidas mais eficazes para prevenir o início do hábito de fumar, estimular a cessação e reduzir o consumo geral.
Jeff Drope, professor pesquisador e diretor da equipe de economia para a saúde da Johns Hopkins, destacou o impacto econômico e social do tabaco, comentando que o custo anual inclui 8 milhões de mortes e perdas econômicas na ordem de US$ 2 trilhões.
Mary-Ann Etiebet, presidente da Vital Strategies, ressaltou a importância de aumentar impostos especialmente em tempos de restrições orçamentárias na saúde pública, visto que essa medida pode gerar receitas adicionais para os governos.
Um estudo recente da Fundação Getulio Vargas recomenda que o Brasil atinja a diretriz da OMS, que sugere uma carga tributária mínima de 75% no preço final do cigarro, atualmente em torno de 70%, enquanto países da União Europeia ultrapassam 80%. O estudo também sugere que os impostos sejam ajustados periodicamente conforme a inflação, incentivando a redução do consumo.
Embora o Brasil tenha sido elogiado por sua política antitabagista, especialistas apontam que a ausência de reajustes no preço do cigarro desde 2016 contribuiu para o aumento na taxa de fumantes, que passou de 9,3% para 11,6% entre 2023 e 2024, com crescimento maior entre mulheres (de 7,2% para 9,8%) comparado aos homens (de 11,7% para 13,8%).
Monica Andreis, diretora da ACT Promoção da Saúde, alerta que o preço do maço de cigarro ainda é muito baixo no Brasil e que a porcentagem do imposto precisa ser acompanhada por aumentos de preço para desestimular o consumo.
A reforma tributária brasileira prevê imposto especial e imposto geral sobre cigarros, que juntos formarão a carga tributária total sobre esses produtos.
Vera Luiza da Costa e Silva, secretária executiva da Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro sobre Controle do Uso do Tabaco (Conicq), enfatiza que, embora haja concordância sobre os benefícios do aumento dos impostos, a implementação enfrenta desafios, incluindo lobby da indústria do tabaco, que alega que isso aumentaria o comércio ilícito. No entanto, estudos mostram que o comércio ilegal é influenciado por outros fatores como criminalidade e que o cigarro ilícito tende a ter preço alto.
Ela defende que o combate ao comércio ilícito deve ser feito com repressão e inteligência, lamentando que esforços sejam quase paralisados, apesar da existência de um protocolo internacional para eliminar o comércio ilegal de produtos de tabaco.
Vários órgãos governamentais brasileiros atuam conjuntamente contra esse problema, mas desafios permanecem, como a necessidade de melhorar o sistema de rastreamento para que consumidores possam identificar facilmente produtos ilegais usando seus celulares.