O Brasil tem registrado um aumento no número de funcionários temporários e cargos políticos no serviço público, enquanto a quantidade de servidores efetivos, aprovados em concurso público, vem diminuindo nos últimos anos, segundo estudo do Movimento Pessoas à Frente.
Entre 2017 e 2023, o total de contratos temporários cresceu 42,1% nos Estados e 10,6% no governo federal, passando de 474.674 para 674.295 e de 13.358 para 14.779, respectivamente.
Já os cargos políticos sem vínculo definitivo aumentaram 14,2% nos Estados e diminuíram 24,1% na União, totalizando um aumento de 11,7% ao somar os dois níveis de governo. O número de servidores concursados diminuiu 11,8% nos Estados e 9,9% na União.
Os governos estaduais afirmam que o crescimento dos temporários ocorreu em razão de contratações emergenciais em áreas como saúde, educação e segurança, justificando restrições legais e financeiras para realizar concursos públicos.
O Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos informou que as contratações temporárias no âmbito federal são excepcionais e não substituem servidores efetivos.
O estudo destaca a falta de regras uniformes entre Estados e União para o uso dessas contratações, que têm se tornado uma prática comum, contrariando o caráter excepcional previsto na Constituição.
A pesquisa considerou dados de 24 Estados, o Distrito Federal e a União, excluindo Alagoas e Rondônia por falta de informações confiáveis.
O Movimento Pessoas à Frente é composto por especialistas, parlamentares e servidores que defendem a reforma administrativa. Los pesquisadores responsáveis pelo levantamento são Felipe Drumond, Myrelle Jacob e Laís Montgomery.
Sergipe foi o Estado com maior crescimento de temporários no período, com acréscimo de 16,3% nos vínculos totais, um aumento impressionante de 1.473% em temporários, 24,7% em comissionados e diminuição de 16,5% em efetivos.
Em 21 dos 26 entes analisados, as contratações temporárias aumentaram, exceto em Ceará, Rio Grande do Norte, Amazonas, Minas Gerais e Paraná. Minas Gerais foi o único que cresceu em servidores efetivos e reduziu temporários e comissionados.
Na União, houve uma diminuição de 9,5% do total de funcionários, com elevação de temporários (10,6%), queda de efetivos (9,9%) e redução de cargos comissionados.
Os autores expressam preocupação quanto à capacidade institucional para planejar a longo prazo e para manter políticas públicas constantes, além dos riscos à valorização das carreiras públicas tradicionais.
O estudo propõe a criação de uma Lei Geral para regular as contratações temporárias, garantindo transparência e eficiência na gestão pública.
“Quando usadas com moderação, transparência e atreladas ao interesse público, as contratações temporárias podem auxiliar na gestão pública”, afirmam os pesquisadores. “No entanto, seu uso excessivo e sem justificativa enfraquece a administração pública, reduz a profissionalização dos servidores e afasta o Estado de seus compromissos constitucionais.”
Debate no Congresso
A questão dos contratos temporários será discutida na reforma administrativa no Congresso Nacional. O relator na Câmara, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), defende que esses contratos tenham duração máxima de cinco anos e incluam quarentena para nova contratação. O projeto ainda está em elaboração.
Segundo Pedro Paulo, sem uma regra nacional, esse regime fica sujeito a abusos, como contratações temporárias breves para evitar direitos trabalhistas. Ele também defende um processo seletivo claro e medidas para combater nepotismo e apadrinhamento.
Essas contratações temporárias são permitidas pela Constituição para casos excepcionais, como substituição de servidores afastados, projetos temporários e atendimento a comunidades específicas, sempre com limites legais.
A área da educação concentra a maioria dessas contratações, representando 28% das hipóteses legais, superando emergências e calamidades, com 21%. Em 2023, a quantidade de professores temporários nas redes estaduais (51,6%) superou a de efetivos.
No governo federal, professores temporários não podem ultrapassar 20% do total de efetivos, com variações estaduais: Espírito Santo permite até 30%, Pará 10%. Em 16 Estados e no Distrito Federal, professores substitutos podem ser recontratados repetidamente sem limite de tempo.
O levantamento ainda aponta deficiências na proteção trabalhista aos temporários: apenas dez Estados oferecem licença-maternidade, vinte pagam décimo terceiro salário e vinte e um garantem férias remuneradas.
O Supremo Tribunal Federal anulou algumas normas estaduais que ampliavam temporários injustificadamente, como tentativas de contratação temporária de policiais em Pará, Goiás e Rio Grande do Sul.
Em alguns locais, as contratações temporárias não têm prazo definido e permanecem enquanto durar a “situação excepcional”, podendo resultar em vínculos indevidos e dificuldade para fiscalização, segundo o estudo.
Os pesquisadores concluem que há um padrão nacional de redução dos servidores permanentes, compensado pelo aumento de temporários e comissionados, com intensidade e estratégias que variam conforme a realidade de cada ente federativo.
Resumo por região
Centro-Oeste: Distrito Federal e estados apresentam redução dos vínculos totais, com aumento relevante de temporários e queda de efetivos.
Nordeste: A maioria dos estados cresce em temporários e cargos comissionados, com algumas exceções como Rio Grande do Norte.
Norte: Crescimento geral dos vínculos, com alguns estados reduzindo efetivos e aumentando temporários.
Sudeste: Estados apresentam queda de servidores efetivos e aumento de temporários, com exceção de Minas Gerais.
Sul: Predominância de redução nos vínculos totais, queda nos efetivos e variações em temporários e comissionados.
Posição dos governos
O Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI) afirmou que as contratações temporárias federais focam demandas excepcionais e de curto prazo, especialmente professores substitutos e agentes ambientais.
O governo do Pará disse que investe na substituição dos temporários por efetivos, respeitando a legislação e direitos trabalhistas.
O Estado do Rio de Janeiro relaciona o aumento desses contratos às restrições fiscais e à necessidade de manter serviços essenciais.
São Paulo destacou que as contratações temporárias são feitas conforme a lei, com concursos regulares para reforçar o funcionalismo público.
Amazonas justificou a redução de efetivos por aposentadorias e a alta de temporários por conta de situações excepcionais, como a pandemia.
Goiás revelou que temporários são usados para flexibilizar projetos e modernização, buscando equilíbrio entre servidores permanentes e temporários.
Paraná enfatizou a prioridade dada aos servidores públicos e a realização de concursos para fortalecer o serviço público.
Minas Gerais destacou uma reforma interna, redução de cargos comissionados e equilíbrio entre contratações.
Santa Catarina relatou avanços em concursos públicos recentes e aumento no quadro policial.
Roraima afirmou que utiliza temporários para atender demandas emergenciais e que mantém uma base sólida de servidores efetivos.
Outros Estados não se manifestaram sobre o assunto.