O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) comunicou aos Estados Unidos que não aceita a legitimidade da investigação comercial aberta contra o Brasil. Em carta enviada ao Escritório do Representante de Comércio dos EUA (USTR) nesta segunda-feira (18/8), o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, argumentou que a base legal para o inquérito adotado pelo governo do ex-presidente Donald Trump é exclusiva da legislação dos EUA, que não possui vínculo com o Estado brasileiro.
“O Brasil reforça que a Seção 301 [da lei estadunidense] é um instrumento unilateral que não está em conformidade com os princípios e normas do sistema multilateral de comércio. O país não reconhece a validade das investigações, decisões ou eventuais medidas retaliatórias realizadas fora do âmbito da Organização Mundial do Comércio, único fórum adequado para resolver disputas comerciais entre seus membros”, declarou Mauro Vieira na correspondência.
A ação dos EUA apura supostas práticas comerciais desleais em território brasileiro. Entre os pontos questionados estão o Pix, o desmatamento ilegal, a propriedade intelectual e o mercado de etanol. O início do procedimento foi anunciado em 15 de julho, há cerca de um mês.
Embora questione a investigação, o chanceler ressaltou o desejo do Itamaraty de manter uma relação positiva com a Casa Branca. “Brasil e Estados Unidos compartilham mais de 200 anos de relações diplomáticas baseadas no respeito mútuo e em valores democráticos”, afirmou.
Mauro Vieira também rebateu alguns argumentos apresentados por Donald Trump ao anunciar a taxação de 50% sobre produtos brasileiros, destacando o superávit comercial dos EUA em relação ao Brasil. Segundo dados americanos, em 2024, os Estados Unidos exportaram US$ 78,4 bilhões para o Brasil e importaram US$ 49 bilhões, gerando um saldo positivo de US$ 29,3 bilhões, o quarto maior superávit dos EUA com qualquer país.
A resposta do Brasil foi enviada ao USTR, órgão do governo americano responsável por negociações comerciais e investigações. Empresas e países estrangeiros utilizam esse canal para apresentar defesas e contestar medidas restritivas. No caso brasileiro, a defesa era esperada até esta segunda-feira.
A investigação se baseia na Seção 301 da Lei Comercial dos Estados Unidos, que autoriza o governo americano a apurar possíveis violações ou irregularidades comerciais por parte de nações estrangeiras.
Sobre comércio digital e serviços de pagamento eletrônico, os EUA alegam que o Brasil criou um ambiente desfavorável para empresas de tecnologia americanas, referindo-se a decisões da Suprema Corte envolvendo grandes empresas de tecnologia. O Pix é citado como uma prática que prejudica serviços de pagamento eletrônicos estrangeiros.
No que diz respeito às tarifas preferenciais, os EUA afirmam que o Brasil teria reduzido taxas de forma injusta em acordos comerciais com grandes parceiros, prejudicando produtos americanos com tarifas mais elevadas.
O documento também aponta o enfraquecimento dos mecanismos de combate à corrupção e transparência, que poderiam prejudicar empresas dos EUA. Além disso, critica a falta de proteção adequada à propriedade intelectual, afetando empresas americanas dos setores tecnológico e criativo.
Quanto ao etanol, os EUA reclamam de tarifas mais altas e de um desequilíbrio comercial derivado da decisão brasileira de eliminar o tratamento recíproco praticamente isento de impostos. Por fim, a carta condena o desmatamento ilegal, afirmando que a conversão dessas áreas em produção agrícola gera uma vantagem indevida em relação a produtores americanos.