ALEX SABINO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
O Banco Central informou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que uma lei aprovada pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, que interrompe o desconto das parcelas do crédito consignado nos benefícios dos servidores públicos, pode afetar diretamente o Sistema Financeiro Nacional (SFN), impactando tanto a disponibilidade quanto o custo do crédito.
Essa ação ocorre após a aprovação, no início de novembro, do decreto legislativo 791 em Mato Grosso, que suspende por pelo menos 120 dias a cobrança de cartão de crédito consignado, crédito direto ao consumidor e outras operações de crédito contraídas por servidores estaduais.
A medida foi justificada como uma forma de proteger servidores que estão enfrentando dificuldades financeiras.
Essa suspensão afeta aproximadamente R$ 12 bilhões em operações de crédito consignado no estado, conforme dados do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT).
O Banco Central pediu para participar como amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif), que inclui a Federação Brasileira de Bancos entre seus membros. A ação solicita que a legislação estadual seja considerada inconstitucional e que o STF conceda uma liminar para suspender sua aplicação, pedido que também tem o apoio do Banco Central.
O termo amicus curiae, que significa “amigo da corte”, refere-se a uma terceira parte interessada que oferece pareceres e informações para ajudar o tribunal na decisão.
O Banco Central alerta que, se mantida, a lei pode aumentar os custos das instituições financeiras, afetando seus resultados. Descreve a legislação de Mato Grosso como “oportunista e injustificada”, capaz de limitar a liquidez mesmo em outras formas de crédito.
O decreto impacta o repasse das parcelas de empréstimos para 28 instituições financeiras que trabalham com crédito consignado, 12 que oferecem cartão de crédito consignado e 25 que operam com cartão benefício.
Os bancos estimam que 62 mil servidores têm contratos ativos, o que representa 60% dos 104 mil funcionários públicos estaduais. Existem cerca de 300 mil contratos ativos, uma média de 4,83 por pessoa.
A ação da Consif argumenta que a lei estadual viola o princípio da separação dos poderes, pois a competência para legislar sobre direito civil e política de crédito cabe à União. Além disso, infringiria o princípio da livre iniciativa.
O ministro Mendonça solicitou posicionamentos do Banco Central, do governo de Mato Grosso e da Assembleia Legislativa, encaminhando o caso à Advocacia-Geral da União (AGU).
“Esse impacto interfere diretamente na avaliação das instituições por investidores e depositantes, podendo reduzir o acesso delas a recursos disponíveis tanto no mercado financeiro local quanto internacional, além do mercado de capitais”, afirma o documento assinado por Cristiano Cozer, procurador-geral do Banco Central.
Em setembro deste ano, a carteira de crédito consignado no país alcançava R$ 718 bilhões, representando 10,55% do total das operações de crédito do Sistema Financeiro Nacional, que somavam R$ 6,8 trilhões.
Em nota, o governo de Mato Grosso afirmou que, apesar de ter sido citado pelo ministro Mendonça, não tem ligação direta com a lei.
O Executivo está envolvido em ação do Ministério Público que investiga empresas suspeitas de prejudicar servidores em operações de crédito consignado. “O estado tem atuado em todas as esferas para identificar e penalizar práticas ilegais ou abusivas que prejudiquem servidores públicos ou a administração”, declarou o governo.
A Assembleia Legislativa de Mato Grosso não respondeu aos e-mails solicitando comentário.

