PEDRO VILAS BOAS
SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS)
O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, publicou uma carta neste domingo (13) onde, sem mencionar diretamente o governo Donald Trump, contesta os motivos usados pelo republicano para aplicar uma taxa de 50% sobre os produtos brasileiros importados pelos EUA.
Barroso afirma que a democracia não permite distorcer a verdade ou negar fatos reais. “A democracia acomoda conservadores, liberais e progressistas. A oposição e a troca no poder são parte essencial do regime. Mas a vida ética deve ser guiada por valores, boa-fé e busca pela verdade”, escreveu o ministro.
Ele rebateu a declaração de Trump, que chamou o ex-presidente Jair Bolsonaro de vítima de uma “caça às bruxas”. “O julgamento ainda está acontecendo. […] Se existirem provas, os responsáveis serão punidos. Se não, serão inocentados. […] No Brasil hoje, ninguém é perseguido. A justiça é feita com base em provas e considerando o direito de defesa”, declarou Barroso.
O presidente do STF recordou ataques à democracia e disse que esperou o governo do Lula se posicionar primeiro. “Era papel do Executivo, especialmente da diplomacia, e não do Judiciário, responder politicamente de imediato, ainda sob a emoção dos fatos”.
TARIFA DE TRUMP
Donald Trump anunciou na quarta-feira uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, válida a partir de 1º de agosto.
No anúncio, ele afirmou que a perseguição contra Bolsonaro era injusta e que a relação comercial com o Brasil é desigual.
Dados recentes mostram que os Estados Unidos têm um superávit comercial de US$ 1,7 bilhão com o Brasil, um aumento significativo em relação ao ano anterior.
A medida de Trump gerou debates. O presidente brasileiro disse que Bolsonaro deveria assumir a responsabilidade pela crise. O deputado Eduardo Bolsonaro afirmou que o governo Lula contribuiu para o problema, mas culpou o ministro Alexandre de Moraes, do STF, como principal responsável.
CARTA INTEGRAL DO MINISTRO BARROSO
“Em defesa da Constituição, da democracia e da Justiça
Em 9 de julho, foram anunciadas sanções contra o Brasil baseadas em uma compreensão errada dos fatos recentes do país. Era papel do Executivo, especialmente da diplomacia, reagir na hora, não do Judiciário. Agora, como chefe do Poder Judiciário, devo esclarecer os fatos recentes do Brasil e a atuação do Supremo Tribunal Federal.
Sociedades democráticas aceitam diferentes pontos de vista, mas isso não autoriza ninguém a distorcer a verdade. A democracia inclui várias ideologias, e a alternância no poder é fundamental. A ética exige valores, boa-fé e busca sincera pela verdade. Apresento uma visão objetiva dos fatos.
Desde 1985, vivemos 40 anos de estabilidade institucional, com eleições livres e respeito às liberdades individuais. Isso é uma grande conquista para um país que sofreu várias rupturas institucionais no passado recente.
Nos últimos anos, houve episódios graves: tentativas de atentados, invasões, acusações falsas de fraude eleitoral, ataques aos ministros do STF, pedidos de impeachment e protestos pedindo a deposição do presidente eleito. Uma denúncia do Procurador-Geral da República fala até de tentativa de golpe com planos de assassinato de autoridades.
Um tribunal independente foi necessário para evitar o colapso das instituições, como aconteceu em outros países. Os processos em curso são públicos, transparentes e respeitam o devido processo legal, com direito à ampla defesa e acesso da sociedade.
O julgamento está em andamento, baseado em evidências e com ampla defesa. Se houver provas, os culpados serão punidos; se não, serão absolvidos. Isso é o Estado democrático de direito funcionando.
Quem não viveu a ditadura deve lembrar que nela havia muita repressão e falta de liberdade. Hoje, ninguém é perseguido e a justiça é feita com base em provas e contraditório respeitado.
O Judiciário, assim como o Executivo e o Legislativo, está sujeito a críticas e divergências, sempre expressas sem qualquer forma de repressão. O STF cumpre seu papel de garantir o governo democrático, o estado de direito e os direitos fundamentais.
Os meios de comunicação circulam livremente, sem censura. O STF protege a liberdade de expressão, anulando leis antigas que restringiam o humor, críticas políticas e biografias não autorizadas. Também protege jornalistas contra assédio judicial.
O Supremo adotou uma posição equilibrada nas decisões sobre plataformas digitais, preservando liberdade de expressão, imprensa e empresarial. Conteúdos ilegais são removidos conforme a lei, e decisões judiciais guiam os casos mais graves.
Em momentos difíceis, devemos valorizar soberania, democracia, liberdade e justiça. O Judiciário está ao lado de quem trabalha pelo Brasil e pronto para defendê-lo.”
