ALEX SABINO
FOLHAPRESS
O Banco Central enviou um pedido ao ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), expressando preocupação com uma lei aprovada pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso. Segundo o Banco Central, essa lei pode afetar diretamente o Sistema Financeiro Nacional (SFN) e alterar as regras para empréstimos consignados em todo o país.
O Banco Central solicitou para participar como amicus curiae no processo de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pela Consif (Confederação Nacional do Sistema Financeiro). Essa ação busca que o STF declare a lei estadual inconstitucional e suspenda sua aplicação temporariamente, pedido que conta com o apoio do Banco Central.
Amicus curiae, que significa “amigo da corte”, é uma figura jurídica onde uma terceira parte, interessada no processo, apresenta informações e pareceres para ajudar os juízes na decisão. O Banco Central também pretende fazer sustentação oral no julgamento.
Em novembro, foi aprovado o decreto legislativo número 791, em Mato Grosso. A lei determina a suspensão, por 120 dias e com possibilidade de prorrogação, dos descontos nas folhas de pagamento para empréstimos consignados feitos por servidores públicos estaduais, incluindo cartão de crédito consignado e outras linhas de crédito.
Com essa suspensão, os bancos deixaram de receber os pagamentos desses empréstimos, afetando 28 empresas que oferecem empréstimos consignados, 12 que operam cartões de crédito consignado e 25 que trabalham com cartão benefício.
Os bancos estimam que cerca de 62 mil servidores estejam com contratos ativos, o que corresponde a 60% dos 104 mil servidores públicos de Mato Grosso. Existe uma média de quase 5 contratos por pessoa, totalizando cerca de 300 mil contratos.
O Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso calcula que a dívida acumulada com consignados no estado está em torno de R$ 12 bilhões.
A Consif argumenta que a lei estadual fere a separação dos poderes, pois a União é responsável por legislar sobre direito civil e política de crédito. Além disso, a lei violaria princípios como a proporcionalidade, a livre iniciativa e a igualdade.
O ministro André Mendonça pediu manifestações ao Banco Central, ao governo de Mato Grosso e à Assembleia Legislativa antes de encaminhar o caso para a Advocacia-Geral da União (AGU).
O Banco Central alertou que, se a lei for mantida, pode causar aumentos significativos nos custos das instituições financeiras, prejudicando seus resultados e restringindo a liquidez, inclusive em outras modalidades de crédito.
Na avaliação do Banco Central, a lei estadual é “oportunista e sem justificativa” e pode dificultar o acesso das instituições financeiras aos recursos nos mercados financeiro local, internacional e de capitais.
Em setembro, a carteira de empréstimos consignados no Brasil somava R$ 718 bilhões, representando 10,55% do total de operações de crédito no Sistema Financeiro Nacional, que é de R$ 6,8 trilhões.
O governo de Mato Grosso declarou que, apesar de ter sido citado pelo ministro Mendonça, não tem relação direta com a lei e está colaborando com investigações do Ministério Público para apurar irregularidades nas operações de crédito consignado que possam ter prejudicado servidores públicos.
A Assembleia Legislativa de Mato Grosso não comentou sobre o assunto quando questionada.
Conforme parecer da Comissão de Constituição, Justiça e Redação, o objetivo da lei é proteger os servidores superendividados, impedindo descontos nos seus benefícios, cobranças durante o período da suspensão, inscrição negativa nos órgãos de proteção ao crédito e a aplicação de juros ou multas.
A lei também prevê que a Controladoria-Geral do estado investigue as empresas que atuam com consignados para que os contratos possam ser revistos, anulados ou renegociados conforme necessário.

