CAROLINA LINHARES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
A bancada negra da Câmara dos Deputados, criada em novembro de 2023 e composta por 135 parlamentares, acredita que agora existem condições políticas para criar um fundo na Constituição Federal. Esse fundo, no valor de R$ 20 bilhões, tem como objetivo promover a reparação econômica e incentivar a igualdade racial.
De acordo com o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), relator da proposta de emenda constitucional (PEC) que cria esse fundo, o momento é favorável por três motivos: um raro consenso entre políticos de esquerda e direita, dados científicos que comprovam a desigualdade racial, e a intenção de impulsionar o empreendedorismo de pessoas pretas e pardas.
A PEC 27/2024, de autoria do coordenador da bancada negra, deputado Damião Feliciano (União Brasil-PB), já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e será votada em breve em uma comissão especial. Ainda não há data definida para a votação em plenário.
Orlando Silva apresentou, no dia 19 de fevereiro, um relatório com algumas modificações no texto original. A prioridade atual da bancada negra é conseguir aprovar essa proposta.
O relator explica que desta vez há um diálogo mais aberto entre a esquerda, o centro e a direita, o que nunca ocorreu antes em torno da pauta da igualdade racial. Além disso, existem estudos confiáveis que mostram os níveis de desigualdade no país, permitindo um debate mais baseado em evidências do que em ideologias políticas.
Damião Feliciano lembra que já houveram outras tentativas no Legislativo para criar fundos semelhantes desde 1988, mas elas não avançaram ou ficaram invisíveis.
O principal objetivo da PEC é a autonomia econômica da população negra, um avanço ainda tímido segundo Orlando Silva.
Ele destaca que, embora alguns indicadores institucionais melhoraram, na prática a população negra ainda enfrenta grandes desafios em renda, emprego e violência. O fundo proposto, chamado Fundo Nacional de Reparação Econômica e Promoção da Igualdade Racial (FNREPIR), teria duração de 20 anos e receberia um aporte anual de R$ 1 bilhão da União, que não seria considerado dentro dos limites das metas fiscais. A fiscalização ficaria a cargo de um conselho formado por membros do governo e da sociedade civil.
O deputado ressalta que o fundo é visto como temporário e espera-se progresso significativo em duas décadas.
Além do aporte federal, o fundo também seria alimentado por multas aplicadas em casos de racismo e trabalho escravo, doações nacionais e internacionais e contribuições de programas públicos e privados voltados à reparação da escravidão.
A proposta ainda inclui incentivar o empreendedorismo de negros, oferecendo condições para que possam competir de forma justa no mercado econômico, o que ajuda a unir diferentes visões políticas em torno do tema.
Na visão do relator, essa iniciativa mitiga debates entre esquerda e direita, reunindo preocupações sociais e liberdade econômica.
A PEC também estabelece como obrigação do Estado e da sociedade combater o preconceito e promover a igualdade racial, garantindo que essa seja uma prioridade permanente e com ações afirmativas. As políticas relacionadas devem ser coordenadas entre diferentes ministérios, estados e municípios, que poderão criar seus próprios fundos e receber recursos do fundo nacional. O texto destaca ainda o reconhecimento das religiões de matriz africana e das comunidades quilombolas.
Na Câmara, o coordenador da bancada negra participa do colégio de líderes, que define a pauta de votações e decisões importantes da Casa.
Para compor a bancada, são considerados deputados que se autodeclararam pretos ou pardos ao se registrarem nas urnas. A legislação eleitoral também exige que 30% dos fundos eleitoral e partidário sejam direcionados a candidatos negros.
A bancada é diversa, e alguns parlamentares admitem que nem todos os seus membros se identificam como negros fora do contexto eleitoral.
Outras conquistas recentes da bancada negra
- 2023 – Atualização das cotas nas universidades: Nova lei amplia as cotas para ingresso no ensino superior, incluindo quilombolas.
- 2023 – Feriado Nacional: Instituição do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra como feriado em todo o país, válido a partir de 2024.
- 2024 – Cota racial nas eleições: PEC que obriga partidos a reservar 30% dos fundos eleitoral e partidário para candidatos pretos e pardos.
- 2024 – Cota racial nos concursos públicos: Lei que reserva 30% das vagas em concursos e seleções temporárias para negros, indígenas e quilombolas.

