Sons suaves, sussurros, estalos de unhas ou o deslizar de um pincel sobre uma superfície. Para quem não conhece, os vídeos e áudios de ASMR podem parecer apenas ruídos aleatórios, mas para milhões de pessoas no mundo, são experiências sensoriais reais e reconfortantes.
A sigla ASMR significa autonomous sensory meridian response, ou resposta sensorial autônoma do meridiano, que é uma sensação agradável de formigamento começando no couro cabeludo e descendo pela nuca e coluna, provocada por estímulos auditivos e visuais específicos.
Esse fenômeno, que surgiu discretamente na internet há cerca de uma década, conquistou alcance global com a popularização das redes sociais. Plataformas como TikTok e YouTube têm bilhões de visualizações em vídeos de ASMR, que funcionam como um “abrigo digital” para pessoas que enfrentam ansiedade, estresse e dificuldade para dormir.
Nos vídeos, criadores de conteúdo reproduzem sons, fazem afirmativas positivas e simulam abrir embalagens, com o objetivo de ajudar quem assiste a relaxar, diminuir a ansiedade e melhorar o sono.
O que ocorre no cérebro ao assistir vídeos de ASMR
O sucesso do ASMR é notável principalmente entre jovens adultos que, diante de uma rotina acelerada, encontram nessa prática um momento de pausa emocional. Para a psicóloga clínica Camila da Silva, da Legacy School, a popularidade desse conteúdo está ligada a uma carência afetiva típica da geração conectada.
“Mesmo que virtual, essa intimidade simbólica atende a uma necessidade emocional real”, destaca Camila.
Além do acolhimento emocional, o ASMR produz efeitos no corpo. Conforme a psiquiatra Daniela Lé Tassinari, do Núcleo de Psiquiatria do Hospital Sírio-Libanês, exames de neuroimagem indicam que esses vídeos ativam áreas cerebrais associadas ao prazer e relaxamento.
Entre as regiões estimuladas estão o núcleo accumbens e o giro frontal médio, que também são ativados ao ouvir músicas agradáveis. Tassinari ressalta que o córtex somatossensorial e a ínsula, setores cerebrais ligados ao processamento de emoções e sensações internas como conforto, também sofrem alteração.
“O ASMR gera uma experiência neurossensorial prazerosa e de segurança, com efeitos físicos visíveis”, explica a psiquiatra.
A combinação de estímulos auditivos e visuais, junto a uma estética calma e acolhedora, ajuda a induzir o relaxamento. O conteúdo também pode ativar memórias sensoriais da infância e provocar sensação de cuidado, mesmo via tela.
Benefícios principais do ASMR
- Redução da frequência cardíaca.
- Relaxamento profundo.
- Estimulação da atenção plena.
- Acolhimento emocional.
- Diminuição da ansiedade.
Nem todos se sentem bem com ASMR
Apesar dos efeitos positivos, o ASMR não atende a todos. Para Tassinari, algumas pessoas acham os sons desagradáveis ou não sentem nada. A resposta depende de fatores como empatia, abertura a novas experiências e consciência corporal.
Camila alerta para o uso excessivo do ASMR como forma de evitar sentimentos: “O problema é quando a pessoa passa a depender somente desses vídeos para se sentir bem, fugindo dos próprios sentimentos”.
Sons como sussurros, palmas, cliques e manuseio de objetos chamam a atenção como gatilhos comuns.
Embora estudos indiquem efeitos reais como a redução da frequência cardíaca e da ansiedade temporária, Tassinari lembra que o ASMR é um complemento e não substitui tratamentos terapêuticos. Pessoas com ansiedade, depressão ou estresse crônico devem buscar ajuda profissional.
Mesmo assim, para muitos, o ASMR é um passo inicial para o autocuidado. Camila comenta: “Há uma sensação de conforto profundo que muitas vezes traz lembranças afetivas da infância e desperta o desejo de ser cuidado”.
Num mundo marcado pelo excesso de estímulos e pela solidão digital, o fenômeno revela-se como uma experiência íntima e acolhedora, ainda que breve.