Analistas foram surpreendidos pelos dados do comércio entre Brasil e Rússia no primeiro quadrimestre de 2022, divulgados pela Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Economia (SECEX/ME) do Brasil. De acordo com as estatísticas, a Rússia aumentou seu volume de vendas de forma significativa e hoje é o quinto principal fornecedor do Brasil.
As exportações russas totalizaram US$ 2,4 bilhões (cerca de R$ 11,5 bilhões), um aumento de 89% em relação ao mesmo período do ano passado. O bom desempenho russo é creditado principalmente aos adubos e fertilizantes, que responderam por 68,67% deste valor.
Mas as exportações brasileiras para a Rússia também cresceram entre janeiro e abril de 2022, em pleno período de crise geopolítica. As vendas do Brasil totalizaram US$ 741,5 milhões (cerca de R$ 3,5 bilhões), uma alta de 81,4% em relação ao mesmo período do ano passado.
O aumento das exportações surpreende, uma vez que existe uma série de desafios logísticos para a exportação para a Rússia em função das sanções econômicas ocidentais. Além das dificuldades de pagamento, as principais empresas de transporte marítimo de cargas deixaram de realizar entregas em portos russos.
A Sputnik Brasil entrevistou o diretor do escritório da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (APEX-Brasil) em Moscou, Almir Ribeiro Américo, para resolver esse quebra-cabeça e traçar as principais tendências do comércio entre Brasil e Rússia.
“Esse crescimento [das exportações para a Rússia] deveu-se sobretudo à performance das exportações de dois produtos: soja e açúcar”, disse Américo à Sputnik Brasil.
Segundo ele, o Brasil exportou 495,2 mil toneladas de soja nos quatro primeiros meses deste ano, o equivalente a US$ 264,2 milhões de dólares (cerca de R$ 1,2 bilhão), “um crescimento de 125% em valor e de 136% de volume exportados”.
No caso do açúcar, Américo relata que o Brasil vendeu 362,4 mil toneladas no primeiro quadrimestre, por US$ 146,8 milhões de dólares (cerca de R$ 705 milhões). Segundo ele, “no mesmo período do ano anterior, a Rússia comprou somente 13,6 mil toneladas de açúcar, devido à supersafra de açúcar produzido localmente naquele período”.
Os demais produtos da pauta comercial brasileira, como carnes e castanhas, “tiveram oscilações menores, logo impactaram marginalmente nessa performance”.
Apesar das altas, Américo nota que a balança comercial continua deficitária para o Brasil em US$ 1,64 bilhão (cerca de R$ 7,86 bilhões).
“Os dados indicam que a Rússia segue amplamente superavitária no comércio com o Brasil”, disse Américo. “Para cada dólar exportado pelo Brasil para a Rússia nesse período, os russos exportaram ao Brasil 3,2 dólares.”
Segundo ele, não há sinais de que o superávit comercial russo possa ser revertido no curto e médio prazo.
“A tendência é que o déficit brasileiro no comércio com a Rússia se amplie no curso de 2022, uma vez que, desde março, em consequência das sanções e bloqueios logísticos devidos aos conflitos na Ucrânia, as exportações de tradicionais produtos brasileiros para a Rússia, como carnes, amendoins, cafés e mesmo o açúcar estão comprometidas por falta de opções logísticas ou pelo aumento dos riscos e custos logísticos para as empresas brasileiras exportarem para o país”, relatou Américo.
Quando perguntado se Brasil e Rússia poderiam encontrar soluções logísticas bilateralmente para manter o fluxo de comércio, Américo explicou que os produtos que têm mais dificuldade são aqueles exportados em contêineres e logo dependem de empresas ocidentais para o seu transporte.
“Acho que temos que analisar essas buscas de soluções produto por produto. Há aqueles produtos que são exportados em contêineres, cuja logística depende de operadoras globais que controlam as rotas e principais frotas desses navios porta-contêineres”, explicou Américo.
Para esses produtos, “as chances de soluções bilaterais entre Brasil e Rússia são mais difíceis, uma vez que dependem de quatro grandes operadores europeus que têm transportado contêineres da América do Sul e aderiram às sanções de maneira severa, deixando poucas opções aos exportadores”.
Por outro lado, os produtos que são transportados em navios cargueiros do tipo graneleiro, como a soja e açúcar, encontram mais facilidades.
“Esses são produtos cujas opções logísticas são menos dependentes dos serviços dos grandes operadores do Ocidente”, disse Américo. “E [exportados em] grandes volumes, que justificam fretamentos exclusivos.”
As facilidades logísticas de produtos exportados em grades volumes por navios graneleiros fretados favorece as exportações russas mais do que as brasileiras, o que explica a tendência de manutenção do déficit comercial do Brasil.
“Os produtos que a Rússia exporta ao Brasil são fertilizantes e derivados do petróleo, logo, o lado russo tem mais opções de manter seu fornecimento ao Brasil do que o contrário”, apontou Américo.
As dificuldades logísticas devem reduzir gradualmente o potencial das exportações brasileiras para a Rússia. Segundo Américo, “é certa e previsível uma diminuição das exportações brasileiras para a Rússia”.
Dados de comércio exterior do primeiro quadrimestre divulgados pela SECEX/ME indicaram um aumento na corrente de comércio entre Brasil e Rússia, com aumento de 81,3% nas exportações brasileiras para a Rússia e de 89% nas vendas russas ao Brasil. Com os resultados, a Rússia se tornou o quinto maior fornecedor do Brasil, atrás somente da China, EUA, Alemanha e Argentina.