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terça-feira, 24/06/2025




Anatel usa brecha na lei para bloquear sites

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LUCAS MARCHESINI
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) tem utilizado uma lacuna na legislação do setor para solicitar às operadoras de internet o bloqueio de sites suspeitos de pirataria. Muitas vezes, essas decisões administrativas são mantidas em sigilo, sem esclarecimento público sobre os motivos que as motivaram.

Conforme o Relatório Anual de Fiscalização da agência, em 2023 foram realizadas 55 operações para bloquear serviços conhecidos como TV Box, dispositivos que permitem o streaming ilegal de filmes e séries. Nessas ações, foram desativados 10,8 mil endereços IP e 1.700 URLs.

Em nota, a agência reguladora explicou: “A Anatel, no âmbito do Plano de Ação para Combate ao Uso de Decodificadores Clandestinos do Serviço de Acesso Condicionado, aprovado por resolução interna, pode ordenar bloqueios para redirecionar o tráfego relacionado à oferta clandestina do serviço de TV paga e ao uso de equipamentos não homologados”.

A agência afirma que a Lei Geral de Telecomunicações proíbe a conexão de dispositivos não homologados pelas redes de telecomunicações, que seria o caso dos equipamentos TV Box.

Thiago Ayub, diretor de tecnologia da Sage Networks, questiona a justificativa da Anatel para essa prática. “A Anatel não é a autoridade responsável pela propriedade intelectual ou direitos audiovisuais; então, sua ação contra os TV Box é vinculada ao fato de esses aparelhos não serem licenciados, pois estão ligados às redes de comunicação”, explicou.

Com esse entendimento, a Anatel intensificou as ações de apreensão dos dispositivos em portos, aeroportos e outros pontos estratégicos.

“Devido à dificuldade de grandes apreensões presenciais, a Anatel passou a adotar uma abordagem remota, bloqueando os sites que facilitam o streaming ilegal”, comentou Ayub. Ele ainda apontou que, a partir dessa ação, a agência acumulou irregularidades.

“Primeiro, como órgão fiscalizador, a agência não deveria atuar dessa forma. Segundo, não existe respaldo legal para essa atuação na internet. Terceiro, as operações ocorrem de forma sigilosa, sem transparência quanto aos critérios de bloqueio, diferente do que ocorre no Judiciário”, destacou.

Ayub criticou que, apesar do discurso anti-pirataria, a Anatel implantou um sistema centralizado e automático para bloqueio de conteúdo, que pode ser usado como ferramenta de censura. Sem transparência, as ações não podem ser devidamente monitoradas.

A Anatel reafirmou que é responsável por adotar medidas técnicas e administrativas para prevenir e interromper a oferta clandestina do serviço de televisão por assinatura, conforme previsto na Lei Geral de Telecomunicações.

No entanto, Ayub destacou que a legislação não contempla a internet, o que torna inadequada a justificativa para bloqueios online baseados na TV por assinatura pirata.

Durante audiência na CPI das Bets do Senado, no final de 2024, a superintendente de Fiscalização Gesilea Fonseca Teles reconheceu que a agência precisa de respaldo legal para realizar bloqueios na internet. Atualmente, a Anatel apenas notifica as prestadoras para que bloqueiem sites ilegais.

Para mudar essa situação, foram sugeridas alterações no Marco Civil da Internet, concedendo à Anatel poderes para fiscalizar, regulamentar e aplicar penalidades no ambiente digital.

Na prática, entretanto, a Anatel já implementa essa atuação por meio da ferramenta Lacre Virtual, que bloqueia automaticamente sites julgados ilegais pela própria agência.

Ayub explica que a Anatel conquistou acesso remoto aos roteadores dos dez maiores provedores do país, de onde injeta os comandos para bloquear os sites, caracterizando um controle centralizado e automatizado.

“Enquanto outros órgãos reguladores atuam como fiscais, a Anatel assumiu a execução direta das medidas. Em vez de simplesmente indicar quais sites devem ser bloqueados, passou a realizar o bloqueio por conta própria”, concluiu.




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