ANDRÉ BORGES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O vice-presidente da República e presidente do Conselho Estratégico da Câmara de Comércio Exterior (Camex), Geraldo Alckmin, iniciou nesta sexta-feira (1º) uma consulta aos membros do conselho para obter autorização para que o Ministério das Relações Exteriores (MRE) possa acionar o sistema de resolução de disputas da Organização Mundial do Comércio (OMC) contra os Estados Unidos.
Esse procedimento é uma formalidade antes de apresentar uma queixa oficial contra os EUA, contestando as tarifas de 50% aplicadas sobre as exportações brasileiras.
A consulta ficará aberta até as 14h de segunda-feira (4) e deverá ser respondida pelos membros do conselho, que incluem, além de Alckmin, ministros como Rui Costa (Casa Civil), Fernando Haddad (Fazenda), Simone Tebet (Planejamento) e Alexandre Silveira (Minas e Energia), além de secretários executivos ligados às políticas econômicas, industriais, comerciais e de relações exteriores.
A autorização tem o suporte de um parecer técnico-jurídico da Advocacia-Geral da União (AGU). Se aprovada, será a resposta oficial do Brasil à ação unilateral dos EUA, protegendo as regras do comércio internacional e os interesses econômicos do país.
De acordo com informações da Folha de S.Paulo, o Brasil está pronto para formalizar a reclamação após o aval do Itamaraty. O país apresenta argumentos firmes e entende que, mesmo com a paralisação da última instância da OMC, os EUA ainda são membros e possuem outros interesses discutidos na organização.
O posicionamento do Itamaraty, que fundamenta a consulta proposta por Alckmin, faz críticas severas às tarifas impostas pelos EUA.
O documento acusa o governo norte-americano de exceder a esfera comercial ao justificar a taxa de 50% com motivos políticos internos brasileiros. “A justificativa para a tarifa de 50% é insustentável”, afirma o Itamaraty. “É uma medida discriminatória, sem base técnica ou respaldo nos procedimentos regulares de defesa comercial.”
O texto aponta que os EUA ultrapassam os limites tarifários acordados com os membros da OMC e afirmam que essa ação prejudica o equilíbrio construído ao longo de décadas de negociações multilaterais, colocando em risco a estrutura global do comércio.
O governo também critica o uso de medidas unilaterais e políticas pelos EUA, que mencionam o ex-presidente Jair Bolsonaro. “A justificativa citada na carta de 9 de julho de 2025 dos EUA vai além da esfera comercial, mencionando alegações como falta de liberdade nas eleições brasileiras, perseguição política ao ex-presidente Jair Bolsonaro e decisões do Supremo Tribunal Federal (STF)”, diz o documento.
Ao optar pelo sistema de solução de disputas da OMC, o Brasil reforça seu compromisso com o comércio internacional multilateral e submete questões jurídicas à avaliação da instituição.
Além do Ministério das Relações Exteriores, outras pastas como Fazenda, Desenvolvimento e Indústria, Agricultura, Planejamento, Gestão, Minas e Energia, Defesa e Casa Civil também manifestarão suas posições.
O acionamento do mecanismo da OMC exige votos favoráveis conforme a legislação que regula a política comercial externa, dentro da Camex, definida por decretos e resoluções federais.
O MRE só pode iniciar o processo na OMC com aprovação expressa do Conselho Estratégico da Camex.
Com a autorização, o MRE poderá enviar imediatamente um pedido formal de consultas ao governo dos EUA e ao Secretariado da OMC, etapa inicial diplomática que dura até 60 dias, para buscar uma solução direta.
Se essa fase não resultar em acordo, o Brasil pode solicitar a formação de um painel arbitral, dando início à fase contenciosa, que envolve julgamentos, recursos, possíveis sanções e decisões que criam jurisprudência internacional.
O Brasil já recorreu ao sistema de solução de disputas da OMC em outras ocasiões contra grandes potências como União Europeia, Canadá e Estados Unidos.
Em 2022, o país acionou os EUA em uma disputa sobre algodão, alegando que os subsídios americanos distorciam preços internacionais e prejudicavam produtores brasileiros.
A OMC reconheceu o Brasil e, após anos, autorizou o país a retaliar os EUA em até US$ 829 milhões, encerrando o conflito com um acordo em que os EUA se comprometeram a pagar US$ 300 milhões ao Brasil e a revisar seus programas agrícolas.