ANDRÉ BORGES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O setor do agronegócio no Brasil, que já enfrenta dificuldades devido a uma taxa extra de 50% imposta pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a partir desta quarta-feira (6), está preocupado com a possibilidade de novas punições, especialmente relacionadas aos fertilizantes, que são essenciais para sua produção.
De acordo com informações obtidas pela Folha, representantes do agronegócio, incluindo empresas e parlamentares da bancada ruralista, alertaram o Itamaraty sobre possíveis sanções ao Brasil a partir da sexta-feira (8). Isso ocorre porque o Brasil mantém negociações com a Rússia, que atualmente é o maior fornecedor de fertilizantes para o país.
Além disso, o Brasil também pode sofrer sanções pela importação de diesel, já que mais de 60% desse combustível adquirido neste ano veio da Rússia, sob o governo de Vladimir Putin.
A Frente Parlamentar Agropecuária não quis comentar o assunto, mas o ambiente é de preocupação. Como o setor agrícola depende muito da importação destes insumos, há uma esperança de que a pressão americana sobre a Rússia não afete as transações comerciais entre Brasil e Rússia.
Em 14 de julho de 2025, Trump afirmou que, se a Rússia não firmar um acordo de paz com a Ucrânia, os EUA aplicarão “tarifas secundárias de 100%” sobre países que continuarem comprando produtos russos.
Essas tarifas fazem parte de uma estratégia diplomática que incluiria penalidades indiretas a compradores de petróleo, gás, urânio e outros produtos russos, como fertilizantes. A informação foi confirmada pelo secretário Internacional do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, e pelo secretário-geral da Otan, Mark Rutte.
Na terça-feira, Trump declarou que decidirá sobre as sanções relacionadas à compra de petróleo após uma reunião com autoridades russas marcada para quarta-feira (6).
Em entrevista, o presidente dos EUA não confirmou que a sobretaxa será de 100%, mas indicou que será algo próximo a isso.
A penalidade não incidira diretamente sobre os fertilizantes importados pelo Brasil, e sim por meio de sanções a outros produtos brasileiros exportados para os EUA, funcionando como uma forma de pressão econômica indireta.
O presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Ricardo Alban, alertou que o governo brasileiro precisa estar atento ao risco de sanções que proíbam a compra de certos produtos. Este é um dos riscos avaliados pela indústria nacional.
“Os Estados Unidos comunicaram à Rússia que, caso o conflito não seja resolvido, haverá retaliações contra quem comprar produtos russos. Compramos petróleo e fertilizantes, que são muito importantes para o agronegócio”, explicou.
A preocupação do setor produtivo brasileiro decorre da grande dependência dos fertilizantes russos. O Brasil é responsável por cerca de 8% do consumo global desses produtos, ocupando a quarta posição mundial, atrás de China, Índia e Estados Unidos. A soja, o milho e a cana-de-açúcar respondem por mais de 73% desse consumo nacional.
Segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), mais de 90% dos fertilizantes usados no país são importados, o que torna o setor vulnerável a variações no mercado internacional e impacta diretamente os produtores rurais. A Rússia é o principal fornecedor, com 30% das importações, ultrapassando países como China, Canadá e Estados Unidos.
Uma delegação de senadores brasileiros esteve recentemente nos EUA para tentar sensibilizar o governo americano sobre as tarifas impostas. Eles retornaram com a informação de que a preocupação dos EUA está, na verdade, relacionada ao volume de combustível que o Brasil compra da Rússia. Esse produto é o segundo mais importado pelo país, ficando atrás apenas dos fertilizantes.
A senadora Tereza Cristina (PP-MS), que participou da missão nos EUA, foi procurada para comentar, mas não se manifestou até a publicação deste texto.
A dependência do Brasil dos fertilizantes russos continua crescendo. Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic) indicam que 2025 deve registrar um recorde na importação desse produto da Rússia.
Apenas no primeiro semestre deste ano, o Brasil importou 5,71 milhões de toneladas de fertilizantes da Rússia, custando US$ 1,98 bilhão. O total anual deve ultrapassar 12 milhões de toneladas, confirmando o maior volume já comprado e repetindo o resultado de 2024, que foi de 12,5 milhões de toneladas.
Na última década, a dependência dos fertilizantes russos cresceu muito: em 2015 foram 3,7 milhões de toneladas importadas, em 2017 aumentou para 5,6 milhões, e em 2019 ultrapassou 7 milhões.
O primeiro aumento significativo aconteceu em 2021, com 9,6 milhões de toneladas importadas, apoiado pela recuperação pós-pandemia. Em 2022, apesar da redução para 8,1 milhões de toneladas, a guerra na Ucrânia fez o Brasil aumentar as compras num mercado afetado. Em 2023, as importações cresceram novamente, chegando a 9,3 milhões de toneladas, e o volume físico continua subindo desde então.