CLÁUDIA COLLUCCI
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Em agosto de 2022, Laillyanne Luiza, 43 anos, agente comunitária de saúde em Itaberaí (GO), participou de um treinamento para aprender a examinar as mamas de mulheres em busca de nódulos. Inicialmente apreensiva, ela ganhou confiança ao perceber que as mulheres da comunidade confiavam nela e se sentiam confortáveis, muitas delas nunca tinham realizado o autoexame.
Laillyanne faz parte de um projeto inovador que combina agentes comunitários, uso de aplicativos e melhorias na gestão municipal. A iniciativa conseguiu reduzir pela metade os casos de diagnóstico tardio do câncer de mama em Itaberaí.
Os resultados iniciais, apresentados no congresso da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco) em Chicago, mostram que no grupo que seguiu as orientações tradicionais do Ministério da Saúde, 60% dos casos foram detectados em estágios avançados, enquanto no grupo atendido pela nova abordagem, esse número caiu para 30%.
O estudo envolveu mulheres com mais de 40 anos, sem histórico prévio de câncer de mama, e que já eram acompanhadas por agentes de saúde. No grupo controle, as mulheres eram orientadas a fazer a mamografia a cada dois anos, de acordo com as recomendações oficiais, enquanto no grupo de intervenção, as agentes receberam treinamento para realizar o exame manual das mamas durante as visitas domiciliares.
Os agentes usam dispositivos com aplicativos chamados Rosa e RosaWatch para registrar informações e encaminhar casos suspeitos para avaliação médica rápida, agilizando todo o processo diagnóstico e reduzindo a necessidade de deslocamentos para centros maiores.
Ruffo Freitas Júnior, oncologista e professor da UFG, idealizador do projeto, destaca a eficiência da estratégia, que facilita o acesso a ultrassons e biópsias locais, acelerando o início do tratamento em até 30 dias quando necessário. O projeto utiliza tecnologia simples, treinamento adequado e reorganização dos fluxos de atendimento, sem necessidade de equipamentos sofisticados.
O cenário nacional do câncer de mama no SUS é preocupante, com mais da metade dos tumores identificados em fases avançadas, o que contribui para atrasos no tratamento em cerca de 60% dos casos. O projeto goiano oferece um modelo replicável, aproveitando a estrutura já existente e capacitando agentes comunitários para melhorar a detecção precoce.
Angélica Nogueira, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, ressalta que, apesar dos avanços terapêuticos, o diagnóstico precoce continua sendo a melhor estratégia para aumentar as chances de cura e reduzir custos públicos.
Essa abordagem demonstra como políticas públicas centradas no fortalecimento da atenção básica e no uso eficaz de recursos podem transformar a luta contra o câncer de mama no Brasil.