FERNANDO CANZIAN
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
De 2022 até julho deste ano, 5,5 milhões de pessoas mudaram do emprego formal com carteira assinada (CLT) para se tornarem pessoas jurídicas (PJs).
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) suspeita que muitos são forçados pelos patrões a virar PJ para que as empresas paguem menos impostos.
O MTE acompanhou os mesmos trabalhadores pelo CPF para saber quando saíram da CLT e entraram como PJs no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas.
Desses, 4,4 milhões (80%) tornaram-se MEIs (Microempreendedores Individuais). Como o MEI tem um limite de faturamento até R$ 81 mil por ano, o ministério acredita que eles têm menos força para recusar a mudança.
Uma pesquisa Datafolha feita em junho mostrou que 59% dos brasileiros preferem trabalhar por conta própria, enquanto 39% acham melhor ser contratado por empresa.
Entre os jovens, a preferência por trabalhar de forma independente é ainda maior: 68% optam pela autonomia.
Criado em 2008, o MEI facilita a formalização de autônomos e pequenos negócios, cobrando menos impostos e contribuições que no regime CLT.
Para as empresas, contratar um MEI é como contratar um prestador de serviço, o que reduz vários custos. No Brasil, o custo do trabalho formal chega a quase 70% a mais que o salário, segundo a Escola de Administração de São Paulo da FGV.
Assim, enquanto um trabalhador CLT paga cerca de R$ 400 por mês para o INSS, um MEI paga apenas R$ 70. Com essa migração de CLT para PJ, o governo deixa de arrecadar mais de R$ 70 bilhões, segundo o Ministério do Trabalho.
Essas informações foram entregues recentemente ao ministro Gilmar Mendes, do STF, para ajudar na decisão sobre o tema.
De 2020 até março deste ano, foram abertas 1,2 milhão de ações trabalhistas pedindo reconhecimento de vínculo empregatício, representando 8,3% do total. Por isso, o ministro Gilmar Mendes mandou suspender temporariamente todos os processos que questionam a legalidade da contratação de trabalhadores como PJs ou autônomos.
Segundo Lorena Guimarães, diretora do Departamento de Fiscalização do Trabalho do MTE, o problema está nos casos de fraude, como garis contratados como MEI, que não têm poder para negociar com os empregadores.
Leonardo Rolim, ex-secretário de Previdência e ex-presidente do INSS, sugere que a queda na arrecadação com essa mudança poderia ser reduzida com a criação de faixas diferentes de contribuição previdenciária.
Ele propõe que trabalhadores informais registrados no Cadastro Único possam pagar 5% de contribuição, enquanto os demais voltariam a pagar 11%. Além disso, avalia que os MEIs mais próximos do limite de faturamento de R$ 81 mil poderiam migrar para um regime parecido com o Simples Nacional.
Mas muitos trabalhadores têm escolhido ser PJs em vez de seguir na CLT, especialmente os com maior escolaridade e que se encaixam no Simples, cujo limite anual de faturamento é de R$ 4,8 milhões.
Estudo do economista Nelson Marconi, da Eaesp-FGV, mostra que em algumas profissões o salário dos PJs chega a ser o dobro do dos trabalhadores com carteira assinada.
O estudo compara os rendimentos médios de diversas profissões entre empregados CLT e os que trabalham por conta própria com CNPJ, usando dados do IBGE.
Nelson Marconi destaca que, para trabalhadores com maior escolaridade e boa capacidade de negociação, a preferência pelo trabalho autônomo cresce, buscando liberdade e flexibilidade na jornada.
