Cientistas americanos acreditam que formações de sílica opalina encontradas na superfície marciana podem ser indícios de vida. Se a ideia for verificada, essa pode ser a pista mais forte já encontrada de atividade biológica no planeta
Uma misteriosa ‘couve-flor’ mineral pode ser a mais nova pista para a busca de vida em Marte. De acordo com os cientistas Steven Ruff e Jack Farmer, da Universidade do Estado do Arizona, nos Estados Unidos, o estranho formato de um material chamado sílica opalina, encontrado na cratera marciana Gusev, pode indicar atividade microbiana no planeta. Se a ideia dos pesquisadores puder ser verificada, esse pode ser um forte indício de vida em Marte, talvez o mais significativo até o momento.
“Devemos ter cautela, pois esta ainda é uma proposta. Até hoje, todos os sinais já encontrados em Marte puderam ser explicados por reações não biológicas e, por isso, nenhuma das descobertas serviu como confirmação inequívoca de vida em Marte” afirma o professor do Instituto de Química da USP, Fabio Rodrigues.
Novas pistas – Em 2008, o robô Spirit da Nasa, descobriu os depósitos de sílica opalina no interior da cratera Gusev, em Marte. O material não chamaria a atenção dos pesquisadores se não tivesse um formato incomum: suas camadas exteriores são cobertas de nódulos minúsculos, como pequenas pontas de um couve-flor. A região da cratera é conhecida pelos astrônomos como um local que pode ter sido cheio de fontes termais e gêiseres que, com o passar dos anos, se tornou árido, seco e desprovido de quaisquer sinais de atividade biológica.
Com a ideia de que esse minério pudesse ter sido “esculpido” por microrganismos, Ruff foi até o deserto do Atacama, no Chile, região considerada a mais seca da Terra e a que os cientistas costumam comparar com a superfície marciana. O solo é semelhante e as radiações ultravioletas que atingem a superfície também imitam as radiações recebidas pelas rochas marcianas. Apesar de Marte não ter a atmosfera repleta de oxigênio, como o Atacama, nem os animais que passeiam pelo local, os pesquisadores acreditam que esse deserto seja uma boa “área de testes” para descobrir como era Marte em seu passado mais quente e úmido. Assim, quando os cientistas encontram algo ali que seja parecido a um evento marciano, é plausível concluir que os dois fenômenos podem ter sido formados da mesma maneira.
Nesse local, no gêiser de El Tato, Ruff encontrou fósseis de sílica muito similares aos identificados em Marte. Essas mesmas formações foram vistas no Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos, e em Taupo, na Nova Zelândia, regiões com muitos gêiseres. Nesses últimos, a sílica guarda vestígios fossilizados de atividades microbianas – são elas que dão ao mineral a aparência de couve-flor. Se microrganismos ajudaram a criar as formações americanas e neozelandesas, provavelmente também poderiam estar envolvidos nos fósseis do Chile e, provavelmente, de Marte. Foi essa ideia que Ruff e Farmer apresentaram no último encontro da American Geophysical Union, em dezembro do ano passado, incentivando a investigação dos minúsculos fósseis pela comunidade astronômica.
Vida marciana – “O que os cientistas viram foi um mineral de sílica, mas que não tinha a forma normalmente assumida por esse material. O importante não é o formato da couve-flor em si, mas a diferença entre uma formação puramente abiótica (não relacionada à vida) e uma que seria mediada por microrganismos”, diz Rodrigues. “Precisamos de mais estudo para mostrar que a formação desse mineral não tem nada a ver com atividades não biológicas. Só depois poderemos afirmar que ele é um indicativo de vida.”
Por enquanto, Ruff e Farmer estão chamando a atenção dos astrônomos para estudar a fundo as estranhas formações marcianas de sílica opalina. A dupla planeja pesquisar a fundo os fósseis encontrados no Atacama, verificar se são gerados por atividade biológica e, se forem, o próximo passo é descobrir que tipo de microrganismo seria esse – e qual sua possível relação com Marte.