O falecimento de Gerson de Melo Machado, jovem de 19 anos que invadiu o recinto de uma leoa em um zoológico de João Pessoa, no último domingo (30/11), ocorreu devido a choque hemorrágico provocado pela perfuração de vasos cervicais, conforme relatório preliminar divulgado pelo Instituto Médico Legal (IML).
A leoa feriu o pescoço do rapaz, atingindo artérias e veias na região. Segundo o laudo, o animal não ingeriu o corpo da vítima.
O IML realizou ainda um exame toxicológico complementar e uma análise de “identificação técnica”. Os resultados estarão disponíveis nos próximos dias.
O corpo de Gerson foi liberado e sepultado no Cemitério do Cristo Redentor, na capital paraibana, na segunda-feira (1°/12). A prefeitura de João Pessoa custeou todos os procedimentos do velório e enterro através do serviço de auxílio funeral para pessoas em situação vulnerável.
Trajetória de abandono e dificuldades sociais
A morte de Gerson evidenciou uma vida marcada por pobreza extrema, transtornos mentais não tratados e negligência familiar. Segundo a conselheira tutelar Verônica Oliveira, que acompanhou o jovem por oito anos, ele cresceu sem suporte e em condições muito difíceis.
“Ele foi uma criança que sofreu diversas violações de direitos. Filho de uma mãe com esquizofrenia, com avós também com problemas mentais, viveu em extrema pobreza”, conta.
A primeira vez que Verônica o encontrou, Gerson tinha 10 anos e foi levado pela Polícia Rodoviária Federal ao Conselho Tutelar após ser visto sozinho em uma rodovia federal. Desde então, passou a fazer parte da rede de proteção à infância.
A mãe de Gerson perdeu o poder familiar há anos, mas ele ainda a procurava com frequência. “Apesar de destituído, ele amava a mãe e tinha esperança de que ela pudesse cuidar dele. Fugia do abrigo e ia direto à casa da avó e da mãe”, relata a conselheira.
No entanto, por sua condição mental, a mãe não conseguia assumir a responsabilidade pelos cuidados do filho. “Ela, muitas vezes, levava-o ao conselho dizendo que não era mais mãe dele. Ela também é vítima de sua doença mental.”
Entre os irmãos, Gerson foi o único que não conseguiu ser adotado. “Exatamente por causa do possível transtorno. A sociedade busca adotar crianças perfeitas, algo impossível dentro do acolhimento institucional, onde as crianças chegam devido a negligência extrema”, afirma Verônica.
Sonho de cuidar de leões
Desde pequeno, Gerson manifestava o desejo de viajar para a África para cuidar e domar leões. Esse sonho era frequentemente mencionado nas conversas com a equipe do Conselho Tutelar.
Em um dos episódios mais graves, ele tentou entrar de forma ilegal em um avião. O relato foi feito por Verônica nas redes sociais.
“Você dizia que iria pegar um avião para fazer um safári na África e cuidar dos leões. Tentou realmente. Agradeci a Deus quando me avisaram que você tinha cortado a cerca e entrado no trem de pouso do avião da Gol. Dei graças porque as câmeras captaram antes que algo ruim acontecesse”, escreveu.
Policiais que atuaram diretamente com Gerson confirmam que ele repetia insistentemente o desejo de ir para a África cuidar dos leões. Com 16 registros por danos e pequenos furtos, ele dizia que caminharia até lá, e os agentes tentavam explicar que o continente está separado por um oceano do Brasil.

