Embora já se saiba que a obesidade na meia-idade está ligada a problemas cognitivos, há poucas informações sobre como as variações de peso durante a vida influenciam o cérebro. Um estudo brasileiro recente mostra que ganhar peso continuamente desde a infância pode acelerar o envelhecimento cerebral em até 6,5 anos.
Publicado em abril no Neurology, essa pesquisa é fruto da tese de doutorado do geriatra Paulo Henrique Lazzaris Coelho, realizada na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e no Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica do Hospital Universitário da USP.
O estudo analisou 11.361 brasileiros do Estudo Longitudinal Brasileiro de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil). Os pesquisadores avaliaram silhuetas corporais relatadas pelos participantes em cinco idades: 5, 10, 20, 30 e 40 anos, classificando-os em categorias de peso.
Quatro padrões de variação foram identificados: peso normal constante, transição de normal para sobrepeso, de abaixo do peso para normal, e sobrepeso constante.
Avaliação da função cognitiva
Os voluntários foram avaliados em três momentos ao longo de oito anos por meio de testes que medem memória, linguagem e função executiva. O teste de memória envolvia a memorização e recordação de listas de palavras; o teste de fluência verbal avaliava a quantidade de palavras produzidas em categorias específicas; e o teste de trilhas mediu a capacidade de planejar e executar tarefas.
Declínio cognitivo acelerado
Os grupos que ganharam peso apresentaram um declínio mais rápido nas habilidades cognitivas comparados aos que mantiveram peso estável. Esse declínio refletiu um envelhecimento cerebral antecipado de 4,6 a 6,5 anos, afetando principalmente a memória e a função executiva.
Paulo Henrique Lazzaris Coelho explica que o ganho de peso pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares e condições associadas, como inflamação crônica e acúmulo de proteínas ligadas ao Alzheimer, contribuindo para o declínio cognitivo.
Desigualdades sociais e impacto
Os efeitos foram mais intensos entre mulheres e pessoas negras ou pardas, apontando para influências sociais e biológicas combinadas. Fatores como acesso limitado à saúde e alimentação, além do estresse associado ao racismo, podem agravar os riscos.
Importância da prevenção
O estudo reforça a importância do controle de peso para proteger a função cognitiva. Coelho destaca que, embora o desempenho cognitivo naturalmente decline após os 35 anos, esse processo se acelera com patologias como as cardiovasculares.
Medidas para evitar o declínio
- Monitorar o peso desde a juventude;
- Adotar dieta equilibrada;
- Praticar exercícios físicos regularmente;
- Estimular atividades intelectuais;
- Garantir sono adequado;
- Controlar doenças crônicas como diabetes e hipertensão;
- Fortalecer relações sociais.
Marco Túlio Pedatella, neurologista do Hospital Israelita Albert Einstein, aponta que a prevenção deve ser multifatorial e adaptada à realidade da população brasileira, possibilitando intervenções eficazes e precoces.
Assim, políticas públicas focadas no controle do peso desde a infância podem promover um envelhecimento cerebral mais saudável, principalmente em grupos vulneráveis.